Salada Verde

Ibama deverá explicar por que contratará serviço já prestado pelo INPE

Ministério Público Federal no Pará quer saber sobre licitação de sistema privado para monitorar o desmatamento na Amazônia. Edital foi aberto na semana passada 

Daniele Bragança ·
27 de agosto de 2019 · 5 anos atrás
Salada Verde
Sua porção fresquinha de informações sobre o meio ambiente
No último dia de julho, Salles apresentou imagens Planet em coletiva onde contestou os dados do Deter, o sistema de alerta de desmatamento do INPE. Foto: Marcos Corrêa/PR

A abertura de edital para a contratação de um sistema privado de monitoramento de desmatamento será alvo de investigação do  Ministério Público Federal (MPF) no Pará. Para os procuradores, há indícios de favorecimento e vantagens competitivas na licitação do novo serviço.

A investigação pretende identificar os motivos que levaram ao abandono das ferramentas já disponíveis, que são fornecidas há anos por órgão estatal, mas também quer saber se não existe violação ao caráter competitivo da licitação. Os procuradores mencionam uma reportagem do jornal Estado de São Paulo, assinada pelo jornalista André Borges, que reportou que o Ibama já fazia “testes gratuitos” com o sistema de monitoramento Planet, que fornece imagens de alta precisão. O sistema pertence a uma companhia americana e é utilizado no Brasil pela empresa brasileira Santiago & Cintra, localizada no interior de São Paulo. Para os procuradores, caso a notícia sobre os testes seja confirmada, isso pode “acarretar em vantagem competitiva para a empresa dos Estados Unidos, o que não é permitido pela lei de licitações”.

Desejo antigo

Afirmações públicas em favor de um sistema alternativo ao do INPE para o monitoramento da floresta amazônica começou antes mesmo do governo atual tomar posse. Em dezembro, Ricardo Salles disse que os dados do INPE eram “genéricos” e não se sabia se o desmatamento estava ocorrendo em terras indígenas, em áreas privadas ou unidades de conservação. A afirmação era falsa. Em janeiro, o ministro disse à repórter Andrea Sadi, do G1/TV Globo, que iria criar um sistema de monitoramento em tempo real no valor de 100 milhões e que esse sistema seria pago pelo Fundo Amazônia. Atualmente, para manter os sistemas de monitoramento do INPE, Deter e Prodes inclusos, o governo gasta R$ 1,5 milhão.

Em palestra ministrada na USP no dia 16 de agosto, o ex-diretor do INPE, Ricardo Galvão, rebateu a justificativa do governo de que o sistema de monitoramento precisa de imagens de maior precisão. “O governo, principalmente o ministro Ricardo Salles, que não é entendido no assunto, está caindo no conto da sereia do vendedor. Para haver alertas de desmatamento, eu não preciso ver com resolução de 2 metros. Tem copa de árvores na Amazônia que tem 15 metros de distância”, disse.

O caso está sendo investigado pelo procurador da República, Ubiratan Cazetta, que aponta com estranheza a omissão, no edital do Ibama, de qualquer explicação para informar os motivos pelos quais os serviços atualmente utilizados, fornecidos pelo INPE, especialmente o Deter, “se tornariam imprestáveis ou não poderiam ser objeto de nova definição de escopo, com imagens mais detalhadas”. O procurador também considera estranho o prazo curto do edital, de apenas oito dias úteis – a contar de 21 de agosto de 2019.

Ibama e INPE tem 30 dias para responder

O MPF enviou ofícios ao Ibama e ao INPE no último dia 23 de agosto e cada órgão tem até 30 de agosto para responder aos questionamentos. Do presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, o inquérito quer saber:

    • Quais motivos levaram ao abandono ou substituição do sistema atual de monitoramento contínuo, prestado pelo INPE;
    • Se foi analisada a possibilidade de que o serviço que se pretende contratar fosse prestado pelo próprio INPE; se solicitou-se ao INPE a adequação dos serviços atuais aos parâmetros descritos no edital de Chamamento Público;
    • Se os produtos que se pretende obter estão disponíveis no mercado e quais empresas os oferecem; e por fim, se é correta a informação de que o Ibama estaria testando, de forma gratuita, o serviço denominado “Planet”, de origem norte-americana, representado no Brasil, com exclusividade, pela empresa Santiago & Cintra.

Ao novo diretor do INPE, Darcton Policarpo Damião, o MPF fez as seguintes perguntas:

    • Se o INPE foi consultado ou informado sobre quais os motivos que, na definição do escopo do Chamamento Público 01/2019, levaram ao abandono ou substituição do sistema atual de monitoramento contínuo; Se o Inpe foi consultado sobre a possibilidade de prestar ao Ibama o serviço que se pretende contratar; se o Ibama solicitou adequação dos serviços atuais aos parâmetros descritos no edital;
    • Se o INPE teria a capacidade técnica e operacional de fornecer os mesmos produtos descritos pelo Ibama”.

Ao mesmo tempo que o Ministério Público Federal no Pará inicia uma investigação sobre a licitação do novo monitoramento, o Grupo de Trabalho de Mudanças Climáticas da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal pediu para que os ministérios do Meio Ambiente (MMA) e da Ciência e Tecnologia (MCTI) esclareçam se os dados sobre desmatamento fornecidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) são confiáveis ou não. O MPF deu 10 dias para que os órgãos respondam aos questionamentos dos ofícios.

 

*Com informações do MPF/PA.

 

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  • Daniele Bragança

    Repórter e editora do site ((o))eco, especializada na cobertura de legislação e política ambiental.

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Comentários 8

  1. Flávio diz:

    Paulo, o empenho no assassinato de reputações só confirma a falta de argumentos. Na dúvida, o desmentido do Salles está no YouTube assim como as contradições entre números do INPE e da NASA, até se acertarem..


  2. Paulo diz:

    O sr. Salles, ministro "desmentido".
    Por favor Flavio, o Salles é um burrocrata jurídico . É um poodle dos mandatários.

    A NASA reafirma os dados do Inpe. Mais um das cortinas de fumaça.


  3. AAI diz:

    Tô querendo ver o que vão conseguir responder!!!


    1. Flávio diz:

      Que o Inpe não é a maravilha que se propõe, que é um cartório dominado por militantes e que apresenta protagonismos estranhos que causam profundo desgaste ao país e grandes prejuízos econômicos como os vistos na crise fabricada dos incendios na Amazônia, tendo sido desmentido ao vivo e a cores tanto por Salles quanto pela NASA.


  4. Paulo diz:

    O MPF esta correto. Já falado e escrito a anos atrás, os políticos, são igual a parafuso, só funcionam quando apertam a cabeça.


  5. Flávio diz:

    O fato é que quanto mais se demonstra o aparelhamento do estado pela "resistência" e o INPE se colocar como monopolista da área, maior a desconfiança gerada e pior a imagem do instituto. Com a questão da Amazônia adquirindo importância geopolítica estratégica com base nos recentes ataques a soberania nacional, com direito a tentativas de se levar a questão para tutela do G7 e apoio da ONU para discussão da internacionalização da Amazônia, o INPE entra em uma esfera em que sua credibilidade pode passar à suspeição.
    A ver…


    1. João da Silva diz:

      Como vc consegue escrever aqui se as suas mãos estão segurando a rôla do Salles?


  6. Paulo diz:

    Morre afogado, mas não aceita ajuda. Teimosia burra.