Reportagens

Megaoperação combate extração de madeira ilegal em áreas protegidas do Maranhão

Quadrilha movimentou mais de R$60 milhões. Trezentos policiais federais, apoiados por servidores do IBAMA, MPF e BOPE MA, estão em campo desde a semana passada.

Fábio Pellegrini ·
18 de julho de 2016 · 8 anos atrás
Superintende da PF no Estado afirma que 99% da madeira extraída vem de unidades de conservação, portanto são ilegais. Fotos: Polícia Federal
Superintendente da PF no Estado afirma que 99% da madeira extraída saem de unidades de conservação, portanto são ilegais. Fotos: Polícia Federal

Um elaborado esquema que envolvia madeireiros, despachantes e até servidores públicos na extração e comercialização de madeira nobre extraída da Terra Indígena Caru e da Reserva Biológica do Gurupi foi interrompido na semana passada. Denominada “Hymenaea” — em alusão a uma espécie de árvore explorada ilegalmente — a megaoperação foi deflagrada pela Polícia Federal (PF) em conjunto com o Ibama, o Ministério Público Federal (MPF) e com apoio do Batalhão de Operações Policiais Especiais do Rio de Janeiro e do Distrito Federal (BOPE-RJ e  BOPE-DF).

Mais de 300 policiais federais, apoiados por servidores do IBAMA,  e técnicos em explosivos do BOPE, com três aeronaves à disposição, estão dando cumprimento a 77 medidas judiciais, sendo 11 mandados de prisão preventiva, 10 mandados de prisão temporária, 56 mandados de busca e apreensão, bem como a suspensão da certificação de 44 empresas madeireiras nos estados do Maranhão, Rio Grande do Norte e Ceará.

A organização criminosa fazia o corte seletivo de madeira nobre e espécies ameaçadas de extinção, de forma a acobertar o crime sob a copa das árvores de menor valor comercial. Dessa forma, sem a necessidade de abrir clareiras na floresta, fazia com que o monitoramento por imagens de satélites não detectasse alterações na cobertura vegetal.

Policiais têm ordem judicial para explodir equipamentos evitando possibilidade de recuperação do material.
Policiais têm ordem judicial para explodir equipamentos evitando possibilidade de recuperação do material.

A madeira extraída ilegalmente era “esquentada” por meio de documentação fraudulenta. Um membro da quadrilha era o responsável por emitir documentos destinados a microempresas laranjas, cadastradas como construtoras em pequenas cidades no interior do Rio Grande do Norte. Essa manobra servia para desviar a madeira para receptadores em todo o Nordeste brasileiro, inclusive grandes indústrias moveleiras.

Estimativas da PF indicam que o grupo teria movimentado valores da ordem de R$ 60 milhões. O esquema vinha causando passivos ambientais de grandes proporções ao longo de anos nos últimos remanescentes de Floresta Amazônica no Maranhão.

As autoridades bloquearam mais de R$ 12 milhões de diversas pessoas físicas e jurídicas. Os valores são provenientes da lavagem do dinheiro adquirido com a extração ilegal da madeira.

Para o superintendente da PF no Maranhão, delegado Alexandre Saraiva, 99% da madeira retirada do Maranhão sai de unidades de conservação federais ou de terras indígenas, o que as torna ilegais: “Fora dessas regiões não existe madeira suficiente para fomentar uma atividade comercial lícita”.

Operação envolve policiais e agentes de várias unidades federativas.
Operação envolve policiais e agentes de várias unidades federativas.

Medidas enérgicas

Dos pedidos de prisão preventiva, 10 foram cumpridos. Trinta e uma serrarias foram explodidas com dinamite pelas forças de segurança. Maquinários pesados como tratores e caminhões também foram destruídos com explosivos para impedir a recuperação judicial por parte dos acusados no futuro.

Segundo o coordenador de Operações de Fiscalização do Ibama, Roberto Cabral, a destruição das serrarias é uma ação mais enérgica, “a última e mais adequada medida, pois várias delas já haviam sido autuadas, embargadas e desmontadas, mas voltaram a funcionar”.

Os investigados responderão por crimes como participação em organização criminosa, lavagem de capitais, roubo de bens apreendidos, impedir a fiscalização ambiental, desmatamento na Terra Indígena Caru, desmatamento na Reserva Biológica do Gurupi, receptação qualificada, ter em depósito produto de origem vegetal sem licença válida, corrupção ativa, tráfico de influência.

O título da operação é alusivo ao gênero de uma espécie de Jatobá (Hymenaea courbaril), que é ilegalmente explorada nessas unidades de conservação. Segundo o diretor de Proteção Ambiental do Ibama, Luciano Evaristo, a operação é resultado da parceria com a PF no Maranhão, que desarticula mais uma quadrilha do crime organizado, tendo como resultado a redução da pressão sobre a floresta.

UCs do Maranhão têm longo histórico de ciclo destrutivo e forte pressão política para exploração de seus recursos.
UCs do Maranhão têm longo histórico de ciclo destrutivo e forte pressão política para exploração de seus recursos.

Arco do Desmatamento

A Reserva Biológica (REBIO) do Gurupi é uma Unidade de Conservação de proteção integral criada pelo Decreto no 95.614 de 12 de janeiro de 1988, com uma área de 271.197 hectares.

A Terra Indígena Caru tem 172.677 hectares, sendo abrigo de aldeias isoladas da etnia Awa. Essas aldeias foram contatadas recentemente e ganharam distinção internacional como uma das últimas isoladas da região nordestina.

Essas UCs, inseridas no Arco do Desmatamento da Amazônia, integram importante mosaico de remanescente de Floresta Amazônica no Maranhão. Têm longo histórico de passivos ambientais, passando por sucessivos ciclos destrutivos e forte pressão política que visam a diminuição de suas áreas e a exploração de seus recursos. A retirada ilegal de madeira das duas unidades de conservação chega a 120 mil m3 por ano, o equivalente a 30 mil árvores, segundo estimativa da movimentação nas serrarias do entorno.

Segundo Roberto Cabral, a degradação ambiental causada pelos cortes torna as áreas mais sujeitas a incêndios florestais, como o que ocorreu em 2015 na TI Araribóia. “Outro dano silencioso é a morte de animais com a caça ilegal pelos infratores”.

O coordenador de Meio Ambiente da Superintendência da PF no Maranhão, delegado Júlio Sombra, afirma que é o inicio de um trabalho que vai perdurar por muito tempo. As buscas e apreensões realizadas vão gerar outros desdobramentos para tentar minimizar a exploração desse último reduto de Floresta Amazônica no Maranhão.

*Editado às 14h do dia 19/07. Ao contrário do que afirmamos anteriormente, a operação contou com a ajuda do BOPE do Rio de Janeiro e do Distrito Federal, e não do BOPE do Maranhão.

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