Colunas

Enquanto o PAC engorda, gastos ambientais estão estagnados

Faltam bons dados sobre gastos ambientais no Brasil. Os que existem revelam a penúria cada vez maior do Ministério do Meio Ambiente

1 de novembro de 2011 · 14 anos atrás
  • Carlos Eduardo Young

    Professor titular do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professor permanente dos Programas de Pós-graduação em Políticas Públicas, Estratégia e Desenvolvimento (PPED) da UFRJ e Ciências Ambientais (PPGCA) da Universidade Estadual do Mato Grosso (Unemat).

Bando de trinta-réis-grande (Phaetusa simplex) sobre a placa de sinalização da Hidrovia do Rio Paraguai, no município de Cáceres (MT). Foto: Carlos Eduardo Young.

Há grande carência no Brasil de estatísticas sobre gastos ambientais, tanto no setor privado quanto no público, seja federal, estadual ou municipal. O IBGE costumava publicá-los, mas parou em 2002. Restou aos acadêmicos reconstruí-los por si mesmos e foi o que fizemos para os gastos ministeriais na pesquisa* resumida nessa coluna. As descobertas não foram alentadoras: o valor absoluto dos gastos do Ministério do Meio Ambiente está, na prática, estagnado desde 2000. E, pior, como proporção dos gastos diretos dos ministérios ligados à infraestrutura caiu de 5% para 2% do total.

Basta olhar para o gráfico, abaixo, para ver que segue reta a linha verde, que representa os gastos do Ministério do Meio Ambiente entre 2000 e 2010. No mesmo período, os gastos do Ministério dos Transportes (linha azul) e das Cidades (linha vermelha) partem de um nível bem mais alto e continuam subindo.

Gráfico 1. Despesas Discricionárias (Executadas) Totais
Fonte: Elaboração própria com base na tabela 9.1.1 das estatísticas fiscais da Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento.

O PAC

As despesas federais diretas em infraestrutura envolvem o Ministério das Cidades, Transportes, Comunicações, Integração Nacional, Ciência e Tecnologia, Meio Ambiente e Minas e Energia. Como proporção a esse grupo, os gastos do Ministério do Meio Ambiente caíram de 5% para 2% em apenas seis anos, entre 2004 e 2010.

O culpado parece ser o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). A partir de 2007, os gastos com infraestrutura se aceleraram.

Os projetos do PAC incrementam as pressões ambientais e, logo, a demanda por recursos para o controle ambiental desses empreendimentos. Era de se esperar que o gasto em controle ambiental crescesse, ao menos, na mesma proporção que as despesas do setor de infraestrutura. Contudo, enquanto os gastos em controle e preservação ambiental estagnaram, os outros cresceram. Como mostra a tabela, o total gasto pelo Ministério dos Transportes aumentou quase quatro vezes, e o total do Ministério das Cidades subiu acima de seis vezes.

A conclusão é que a qualidade da proteção ambiental deve ter caído, e que os novos projetos nos reservam, no futuro, problemas ambientais sérios.

Evolução das despesas discricionárias dos Ministérios dos Transportes, Cidades e Meio Ambiente, 2007-2010
  2007 (em R$ de 2010) 2010 (em R$ de 2010) Variação
Ministério dos Transportes 4.096.201.347 15.664.567.290 282%
Ministério das Cidades 1.887.381.270 12.653.686.393 570%
Ministério do Meio Ambiente 660.043.219 694.434.147 5%
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento

Estradas

A literatura sobre determinantes do desmatamento aponta que a abertura ou pavimentação de estradas é o fator mais importante para explicar perdas em florestas nativas. Espera-se, portanto, que haja uma expansão significativa das pressões de desmatamento após a conclusão das obras de estradas beneficiadas pelo PAC que cortam áreas hoje ainda bastante preservadas (por exemplo, o asfaltamento da BR 163 Cuiabá-Santarém, ou da BR 319 Manaus-Porto Velho).

A estratégia de defesa da floresta adotada pelo Governo Federal foi a criação de novas Unidades de Conservação, especialmente nas áreas onde se espera mais pressões de desmatamento. Porém, não houve aumento dos recursos para protegê-las, como se pode observar nos gastos dos itens preservação e controle ambiental (Gráfico 2).

Gráfico 2. Despesas – Subfunções (absoluto)

Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento.

Essa análise utilizou apenas dados referentes ao Governo Federal, mas a literatura aponta que a situação na maioria dos estados e municípios é semelhante. Nesses casos, é muito mais difícil fazer o acompanhamento dos gastos ambientais, apesar de proporcionalmente serem as esferas locais as que mais gastam em meio ambiente (Young e Roncisvalle 2002; Lemos et al. 2005). Em outras palavras, a situação pode ser ainda pior.

* Essa coluna foi escrita baseada no texto “Evolução recente das despesas ambientais do governo federal brasileiro”, de Carlos Eduardo Young (professor associado do Instituto de Economia da UFRJ) e André Santoro (acadêmico do Curso de Ciências Econômicas do IE/UFRJ)

 

Referências

LEMOS, R.; YOUNG, C. E. F.; GELUDA, L. 2005. Orçamento Público para Gestão Ambiental: uma análise voltada para áreas protegidas. III Simpósio de Áreas Protegidas. Universidade Católica de Pelotas.

YOUNG, C.E.F.; Roncisvalle, C.A. (2002). Expenditures, investment and financing for sustainable development in Brazil. Santiago de Chile: CEPAL.

Leia também

Notícias
19 de dezembro de 2025

STF derruba Marco Temporal, mas abre nova disputa sobre o futuro das Terras Indígenas

Análise mostra que, apesar da maioria contra a tese, votos introduzem condicionantes que preocupam povos indígenas e especialistas

Análises
19 de dezembro de 2025

Setor madeireiro do Amazonas cresce à sombra do desmatamento ilegal 

Falhas na fiscalização, ausência de governança e brechas abrem caminho para que madeira de desmate entre na cadeia de produção

Reportagens
19 de dezembro de 2025

Um novo sapinho aquece debates para criação de parque nacional

Nomeado com referência ao presidente Lula, o anfíbio é a 45ª espécie de um gênero exclusivo da Mata Atlântica brasileira

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.