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Presença de tucanos mantém diversidade das palmeiras juçara

Estudo demonstra que extinção de tucanos e outras aves de bico grande compromete qualidade de frutos das palmeiras juçara no bioma Mata Atlântica.

Vandré Fonseca ·
11 de junho de 2013 · 11 anos atrás
Tucano-de-bico-preto: Graças ao grande bico, ele pode dispersar sementes maiores da juçara. Infelizmente, o animal foi extinto é vários locais da Mata Atlântica. Foto: Lindoufo Souto
Tucano-de-bico-preto: Graças ao grande bico, ele pode dispersar sementes maiores da juçara. Infelizmente, o animal foi extinto é vários locais da Mata Atlântica. Foto: Lindoufo Souto

Manaus, AM – As juçaras sofrem com a falta dos belos tucanos, antes abundantes mas agora desaparecidos em muitas áreas do que sobrou da Mata Atlântica. Aqueles bicos eram grandes o suficiente para carregar as maiores e melhores sementes, que assim espalhavam as palmeiras mata afora. Está certo que ainda existem pássaros menores que fazem o mesmo trabalho. Mas um bico de um sabiá nem de longe pode ser comparado ao de um belo tucano ou de um araçari (ave parecida com tucano, mas de menor porte).

Em um estudo publicado no dia 31 de maio, na revista Science, um grupo de pesquisadores liderados pelo doutor Mauro Galetti, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), demonstra que a extinção das grandes aves está interferindo na evolução das palmeiras. Os pesquisadores notaram que onde os tucanos haviam sido extintos há mais de 50 anos, as juçaras produziam frutos pequenos, enquanto nas matas conservadas, habitadas pelos pássaros, o tamanho do fruto variava.

Análises genéticas e ecológicas ajudaram a explicar a diferença. Onde não existem tucanos ou outras aves com bicos grandes, juçaras são dispersadas por pássaros menores, como sabiás. Acontece que os frutos maiores não cabem no bico do sabiá. Eles caem embaixo da palmeira e não geram novas plantas. Apenas as sementes menores são dispersadas. Mais de 9 mil sementes de 22 populações diferentes da palmeira foram coletadas e analisadas pelos cientistas, por meio de modelos estatísticos, genéticos e ecológicos.

Os pesquisadores alertam que as sementes mais miúdas sofrem maior mortalidade por dessecamento, ou seja, por perderem a umidade. Isso significa que podem ficar mais vulneráveis nos períodos de seca mais severos, previstos em modelos climáticos como consequência do aquecimento global. “Esse trabalho mostra que a integridade da floresta é importante para manter os grandes dispersores de sementes”, afirma Galetti. “Os tucanos são importantíssimos para as plantas, porque além deles dispersarem muitas sementes, eles estão entre as poucas aves que comem sementes grandes. Com a extinção dessas aves, muitas espécies de plantas podem estar sofrendo a mesma coisa do palmito juçara”, completa.

O estudo é também um dos poucos a registrarem de forma bem-sucedida as rápidas mudanças evolucionárias provocadas por ações humanas. Pesquisadores estimam que a atividade, como desmatamento, acelera em cerca de 100 vezes os processos evolucionários naturais de extinção. “É muito provável que a destruição predominante e generalizada de vertebrados de grande tamanho em seus hábitats naturais esteja causando mudanças sem precedentes nas trajetórias evolucionárias de diversas espécies tropicais”, afirmou o pesquisador da Unesp.

Aproximadamente 80% de todo o bioma da Mata Atlântica é mantido em pequenos fragmentos, de acordo com os pesquisadores. De acordo com Galetti, a perda de habitats e extinção de espécies causam mudanças drásticas na composição e estrutura dos ecossistemas. “Isso envolve a perda de funções essenciais do ecossistema, as quais podem resultar em mudanças evolucionárias numa velocidade bem superior àquela prevista. Nosso trabalho destaca a importância de identificar essas funções essenciais para diagnosticar o colapso funcional dos ecossistemas”, afirma.

Além da Unesp, cientistas da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Goiás e de institutições da Espanha e México particiaram do estudo, que contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e do Programa Iberoamericano de Ciencia e Tecnología para o Desenvolvimento.

Crédito: Divulgação | Clique para ampliar
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Seleção Natural Rápida

Aves grandes, como tucanos e araçaris, desempenham um papel importante na dispersão, principalmente de grandes sementes. Aves menores, como sabiás, não conseguem engolir as sementes menores e, portanto, não podem carregá-las. Ou seja, sem tucanos, as florestas tendem a perder sementes grandes com o tempo. As sementes menores são também mais vulneráveis ao dessecamento e podem não resistir às mudanças climáticas.

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