Análises

Sustentabilidade Corporativa: um desafio para empresas brasileiras

Empresa líderes na Europa e nos EUA adotam padrões sócio-ambientais em seu sistema de governança. Exigência de mercado. Agora é a vez das brasileiras.

Clarissa Lins ·
29 de outubro de 2004 · 20 anos atrás

A sustentabilidade corporativa, ou responsabilidade social corporativa, exige nova postura por parte dos gestores e controladores das empresas. Estamos falando de uma nova postura ética, de novos padrões de comportamento e compromissos perante os diferentes públicos de interesse. Trata-se de incorporar à visão estratégica tradicional as vertentes social e ambiental, em suas diversas dimensões.

Cada vez mais, consumidores, financiadores, acionistas e potenciais investidores exigem das corporações um compromisso abrangente frente ao ambiente em que atuam e se inserem. A agenda é ampla e passa por adotar as melhores práticas de governança corporativa. Manter um bom relacionamento com as comunidades do entorno. Ouvir e levar em conta a sociedade civil. Dar espaço e boas condições de trabalho à mão de obra. Manter relações cordiais com as diversas esferas de Governo. Inclui, também, considerar questões sociais e, sobretudo, ter uma atitude pró-ativa de preservação e respeito ao meio ambiente e ter uma política social de longo prazo.

Na Europa e nos Estados Unidos, essa já é a agenda de empresas líderes e de gestores de recursos, pressionados pelo impacto que fatores como as mudanças climáticas globais podem ter sobre os negócios no longo prazo. A Bolsa de Valores de Nova York foi pioneira no lançamento de Índices de Sustentabilidade (Dow Jones Sustainability Indexes – DJSI), em 1999, mas hoje já é seguida, por exemplo, pela bolsa de Londres (Índice FTSE4Good). O índice da bolsa de Nova York procura selecionar apenas as empresas líderes em sustentabilidade nos seus respectivos setores de atuação, buscando manter um grupo não superior a 10% daquelas consideradas melhores. Cria-se um esquema de competição, de forma a manter aceso o desafio de adotar de forma permanente e inovadora as melhores práticas. As empresas brasileiras hoje listadas no Índice de Sustentabilidade do Dow Jones são Banco Itaú, Holding do Grupo Itaú e Cemig.

No Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo – Bovespa já anunciou sua intenção de criar um Índice de Responsabilidade Social e Sustentabilidade em 2005, composto por ações de empresas socialmente responsáveis e sustentáveis a longo prazo. Isto certamente ajudará a fomentar iniciativas consistentes nas esferas ambiental e social por parte das empresas com ações listadas em bolsa.

Por outro lado, gestores de recursos preocupados com as dimensões sociais e ambientais das empresas nas quais investem já se organizaram em torno do conceito de Investimentos Socialmente Responsáveis (SRI na sigla em inglês). O patrimônio dos fundos geridos sob esta égide no mundo já monta a cerca de US$ 2,7 trilhões. Esses são sinais claros e evidentes de que o mercado financeiro e a sociedade de modo geral vêm incorporando outras dimensões às suas considerações econômico-financeiras.

Nesta lógica que busca maior harmonia entre empresa e o contexto no qual se insere, entre recursos naturais finitos e retorno financeiro, os indicadores econômicos não conseguem mais, sozinhos, dar a dimensão da inserção das empresas na sociedade. A eles, é preciso e premente incorporar indicadores quantitativos sociais e ambientais, numa lógica conhecida por triple bottom line. Em termos objetivos na questão ambiental, por exemplo, deve-se pensar não apenas em atendimento aos quesitos legais, busca de certificações ISO 14001, mas também na definição de políticas corporativas relacionadas a créditos de carbono, energias alternativas ou biodiversidade.

É preciso também que os Relatórios Anuais venham acompanhados de Relatórios de Sustentabilidade para que se compreenda por inteiro a contribuição da empresa para o desenvolvimento sustentável. Enfim, é preciso agregar aos instrumentos clássicos de gestão as dimensões social e ambiental, numa visão de que empresas podem ser elementos indutores do desenvolvimento sustentável.

As empresas brasileiras, de modo geral, estão avançando nesta agenda. Todavia, o foco ainda tem sido em melhorar as práticas de boa governança, por um lado, e consolidar a visão de Responsabilidade Social, por outro, que são aspectos fundamentais dessa agenda, mas não suficientes. Nossa convicção e a evidência empírica internacional mostram que o mercado tende a premiar aquelas que assumirem um compromisso com o conceito mais amplo da Sustentabilidade, de forma pró-ativa. Esta é a nossa aposta: empresas brasileiras serão líderes aqui e no exterior, tendo acesso a recursos qualificados e beneficiando-se de uma menor percepção de risco, quando incorporarem o compromisso com a Sustentabilidade em sua visão e estratégia de negócios, com reflexos em seus processos, procedimentos e políticas, reafirmando o compromisso com o desenvolvimento sustentável.

* Clarissa Lins é Diretora da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável.

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