Reportagens

Geraldo Abreu: “Implementar Código Florestal é o maior desafio”

Em entrevista exclusiva, responsável pelo programa ambiental de Dilma diz que governo acertou mais que errou e sugere correções de rumo.

Maurício Thuswohl ·
25 de agosto de 2014 · 10 anos atrás

Geraldo Vitor de Abreu, formulador do programa ambiental de Dilma: segundo ele o atual governo faz mais do que os críticos enxergam.  Imagem:
Geraldo Vitor de Abreu, formulador do programa ambiental de Dilma: segundo ele o atual governo faz mais do que os críticos enxergam. Imagem:

Integrante da Secretaria Nacional de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do PT e responsável pela elaboração do programa ambiental de governo da presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição, o ambientalista Geraldo Abreu defende o legado dos doze anos de governo petista ao mesmo tempo em que pede maiores avanços na aplicação de políticas públicas ambientais em áreas como redução do desmatamento, gestão dos recursos hídricos e das Unidades de Conservação, fortalecimento das energias renováveis, pagamento por serviços ambientais e mais agilidade nos processos de licenciamento ambiental.

Ex-diretor de Cidadania e Sustentabilidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Abreu, nesta entrevista exclusiva, defende um maior diálogo com os diversos setores da sociedade para que sejam efetivadas ações de governo como o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e admite que, em um eventual segundo mandato de Dilma, alterações poderão ocorrer em temas polêmicos que passaram pelo Congresso Nacional, como o Código Florestal ou a Lei Complementar 140 que, segundo os críticos, reduz poderes do Ibama. Leia a seguir a íntegra da entrevista:

((o))eco: A aprovação do Código Florestal é citada no programa do PT como uma das conquistas do governo Dilma na área ambiental, apesar do repúdio de inúmeras entidades representativas da sociedade civil, que criticam o viés ruralista da lei, sobretudo por anistiar proprietários que desmataram no passado e deixar de exigir a recomposição de milhões de hectares de floresta. Como a presidente pretende lidar com essa questão em um segundo mandato?

Se tivermos que fazer alterações no futuro, faremos. Mas, o essencial nesse momento é garantir a implementação do Código como foi aprovado. O Código Florestal anterior datava dos anos 60 e, ao longo do tempo, foi recebendo emendas que nos trouxeram situações bastante delicadas. Mudanças precisavam ser feitas, mas esse debate deveria ter sido protagonizado pela sociedade. Só que isso não aconteceu, e a iniciativa da discussão veio principalmente do agronegócio e dos setores ligados à agricultura, que viam no Código um entrave à regularização de suas atividades. Eles fizeram uma grande mobilização e aprovaram alterações, criando um novo Código.

O Congresso fez o debate na Câmara e depois no Senado. O governo entrou no debate e, mesmo em situação de minoria, expressou suas opiniões e conseguiu promover no Senado modificações no texto aprovado na Câmara. O texto voltou à Câmara e, aprovado, foi à sanção da presidenta Dilma, que utilizou seu poder de veto para retirar na sua integralidade todas as aberrações que estavam indicadas, algumas inclusive pelo movimento ambientalista.

É fundamental que sejam levados a cabo os principais instrumentos que o novo Código trouxe, que são o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o Programa de Regularização Ambiental. Cabe a nós agora fazer a implementação do novo Código e a regularização fundiária por meio do CAR para que conheçamos a real situação do nosso campo e saibamos como as propriedades têm sua Reserva Legal, sua Área de Proteção Permanente, suas áreas de proteção de mata ciliar e de nascentes. Enfim, o CAR nos permitirá, além do maior programa de reflorestamento do mundo, ter um real diagnóstico da situação rural no Brasil. Nós saímos do período do faz-de-conta, onde as pessoas deitadas em berço esplêndido esbravejavam que nós tínhamos a melhor legislação do planeta, mas o país vivia um real processo de degradação no campo.

((o))eco: O Brasil é elogiado mundialmente pelos resultados obtidos na redução do desmatamento da Amazônia, mas dados divulgados pelo Imazon registram um forte recrudescimento desde junho. Quais ações serão tomadas em um segundo governo Dilma para deter o desmatamento da Amazônia?

“Há empenho do governo para que o desmatamento permaneça na decrescente e para que, com a implementação do CAR e o reflorestamento das áreas de Reserva Legal e de Proteção Permanente, possamos iniciar uma curva ascendente de ganho de área líquida em florestas plantadas.”

Primeiro, é necessário esclarecer que, desde o primeiro mandato do presidente Lula, o governo instituiu um plano de combate ao desmatamento. Esse plano reúne onze ministérios sob a coordenação da Casa Civil até 2010 e depois sob a coordenação do MMA. Nesse período, nós observamos uma queda no desmatamento da Amazônia Legal. Os últimos quatro dados da série histórica são os melhores de toda a série. Em 2012 tivemos o menor índice de toda a série histórica, chegando a 4.570 km². Em 2013 há a estimativa de uma pequena elevação para 5.843 km². Considerando que em 2010, que foi o último ano do governo Lula, nós tivemos um índice de sete mil km², há uma clara manutenção da queda do desmatamento.

Há empenho do governo para que o desmatamento permaneça na decrescente e para que, com a implementação do CAR e o reflorestamento das áreas de Reserva Legal e de Proteção Permanente, possamos iniciar uma curva ascendente de ganho de área líquida em florestas plantadas. A vigilância e a fiscalização são fundamentais para que continuemos a conseguir os índices que estamos conseguindo e a contribuir para cumprir as metas que assumimos em Copenhague, mesmo não tendo a obrigação de assumi-las. Nossas reduções de emissões já chegaram às nossas metas e é necessário avançar ainda mais.

((o))eco: E em relação aos biomas não amazônicos que também sofrem com o desmatamento, como o Cerrado e a Mata Atlântica?

Em 2010 instituímos um plano voltado ao Cerrado, o PPCerrado, que trabalha com ordenamento territorial de áreas protegidas, monitoramento, controle e fomento das atividades produtivas e já alcançou resultados bastante razoáveis. Os números indicam uma queda do desmatamento em 2008/2009 e 2009/2010 na ordem de 50% em relação ao período entre 2002 e 2008. Então, já temos alguns indicadores de que o plano de combate ao desmatamento do Cerrado, bioma que vive uma pressão muito grande por conta das atividades no campo, já começa a dar resultados. A expectativa é que possamos ampliar o quadro de servidores na área de fiscalização para que os resultados que já obtivemos na Amazônia possam também acontecer no Cerrado, na Caatinga, na Mata Atlântica, nos Pampas e no Pantanal.

((o))eco: O Brasil continuará a executar megaprojetos de infraestrutura com grande impacto ambiental, como a construção da usina de Belo Monte, no Xingu, ou transposição do Rio São Francisco? A principal aposta para a geração de energia elétrica em um segundo governo Dilma continuará sendo as hidrelétricas?

“Desde o presidente Lula, o governo vem buscando exigir para essas obras tecnologias que impactem o menos possível. O impacto dessas usinas que fazem a geração de energia elétrica por fio d’água, por exemplo, é apenas 20% do impacto causado pela Usina de Itaipu.”

Nós precisamos conviver com uma situação contraditória, pois o Brasil tem um déficit de infraestrutura reclamado por todos, principalmente no que se refere à logística para o escoamento da produção. Para sanar isso, temos a necessidade de ampliar nossa oferta de energia. Nós temos a matriz elétrica mais limpa do mundo, mas, apesar disso, as hidrelétricas que compõem a maior parte dessa matriz causam também bastante prejuízo do ponto de vista ambiental, social e cultural nas comunidades onde são instaladas.

Desde o presidente Lula, o governo vem buscando exigir para essas obras tecnologias que impactem o menos possível. O impacto dessas usinas que fazem a geração de energia elétrica por fio d’água, por exemplo, é apenas 20% do impacto causado pela Usina de Itaipu. São cinco vezes menos alagamento. Ainda assim, há consequências para as populações que vivem nessas regiões e também para o meio ambiente. Nós precisamos encontrar soluções para esses problemas.

Existem contradições, mas o pior dos mundos é o governo não enfrentar os desafios e não exigir que os impactos sejam os menores possíveis. E mais: escutar a população, principalmente das regiões afetadas.

((o))eco: Quais os planos de desenvolvimento para as fontes alternativas de energia, como a solar e a eólica?

É necessário diversificar a nossa matriz energética com fontes renováveis que impactem menos o meio ambiente. O governo Dilma está trabalhando nesta direção com seus institutos de pesquisa. Fez alguns leilões de eólicas. Também já estamos incluindo aquecimento de água por placas solares no programa habitacional Minha Casa, Minha Vida. Além dos leilões, temos parcerias no exterior para poder trazer tecnologia de ponta para essa geração de energia de menor impacto. Precisamos ampliar nossa oferta de energia e ao mesmo tempo garantir que essa energia seja produzida por fontes renováveis. Temos também que ganhar eficiência na transmissão da energia, que no Brasil tem muita perda.

((o))eco: Como fazer para avançar na gestão dos recursos hídricos e das bacias hidrográficas? O governo federal pode contribuir para evitar problemas de escassez como o que acontece hoje em São Paulo?

“Nossa expectativa é de que ainda neste mandato possamos ter pelo menos três ou quatro novas UCs [Unidades de Conservação]. O mais importante é que nós tenhamos cuidado com as UCs, pois muitas foram criadas sem que se levasse em consideração condições essenciais como, por exemplo, a regularização fundiária.”

É fundamental que tenhamos planejamento. No site da Agência Nacional de Águas (ANA) na internet há um atlas dos nossos recursos hídricos, produzido nesta gestão, que dá todo o quadro hidrológico de cada município brasileiro. Essas informações precisam ser utilizadas para o planejamento dos estados e municípios e dos rios nacionais para que não repitamos o que a população de São Paulo está enfrentando, onde, não temos dúvida, além da seca houve uma ausência de planejamento para evitar que a situação chegasse ao ponto em que chegou, comprometendo o abastecimento de água.

Precisamos ter mais obras que garantam segurança hídrica para toda a população brasileira. O governo federal vem fazendo o que pode, vem trabalhando em parceria com os estados e municípios, vem liberando recursos nesta direção.

Unidades de Conservação

((o))eco: O governo Dilma praticamente não criou Unidades de Conservação. Em um segundo mandato será diferente?

Nossa expectativa é de que ainda neste mandato possamos ter pelo menos três ou quatro novas UCs [Unidades de Conservação]. O mais importante é que nós tenhamos cuidado com as UCs, pois muitas foram criadas sem que se levasse em consideração condições essenciais como, por exemplo, a regularização fundiária. Vivemos hoje um problema gravíssimo de regularização fundiária nas UCs e, ainda assim, se for observada a transferência de área para que as desafetações fossem feitas durante esta gestão, há um ganho de área líquida. Também estamos trabalhando para estruturar as UCs que já existem. Além de criar novas UCs, é importante que nós tenhamos um corpo de funcionários que possa dar conta de cuidar dessas UCs.

((o))eco: Mas, um problema ainda sem solução é a carência de pessoal especializado para fiscalizar a contento as UCs e demais áreas protegidas do país. Existe um plano para fortalecer órgãos governamentais como, por exemplo, o Ibama e o ICMBio?

“Continuaremos a estruturar o ICMBio para dar a ele força para que nossas UCs efetivamente sejam conservadas – e ao Ibama para que ele possa proceder a fiscalização e suas outras funções – com servidores que tenham compromisso com esses órgãos”

Em cada um dos quatro anos do governo Dilma, o Ministério do Planejamento, por ordem da presidenta, liberou concursos tanto para o ICMBio quanto para o Ibama. No passado, houve um sucateamento dos recursos humanos desses órgãos. O que tivemos de fazer nesses últimos doze anos foi reestruturar o quadro de servidores da área ambiental. Fizemos vários concursos e estamos com outros concursos para fazer, mas tem gente na oposição que acha que a máquina do Estado está muito pesada e que não é necessário contratar servidores para cuidar das UCs. Não adianta só criar, tem que criar e cuidar. Continuaremos a estruturar o ICMBio para dar a ele força para que nossas UCs efetivamente sejam conservadas – e ao Ibama para que ele possa proceder a fiscalização e suas outras funções – com servidores que tenham compromisso com esses órgãos.

((o))eco: Em um segundo mandato, haverá alguma iniciativa de Dilma para alterar os efeitos da Lei Complementar 140 que, segundo os ambientalistas, diminui o poder de fiscalização do Ibama?

Veja bem. O movimento ambientalista brasileiro lutava pela regulamentação do Artigo 23 da Constituição, que tratava exatamente das responsabilidades e atribuições dos órgãos federais. Até a Constituição, nós tivemos uma gestão ambiental centralizada nacionalmente, e isso demonstrava a impossibilidade de uma gestão efetiva que desse consequência às ações. A Constituição trouxe a necessidade de os municípios e estados também terem as suas responsabilidades com a gestão ambiental, mas a regulamentação só aconteceu por meio da Lei Complementar 140.

O que nós precisamos agora é dar materialidade aos instrumentos da LC 140. Há divergências em relação ao seu conteúdo, mas é necessário construir a partir dela quais são as atribuições dos municípios, dos estados e da União para que a federação possa melhorar a gestão ambiental em todo o território brasileiro. O positivo é que o Congresso Nacional, depois de mais de 20 anos, fez a Lei Complementar. A LC 140 é um ponto de partida.

((o))eco: O governo pretende, em um eventual segundo mandato, incentivar o uso público dos parques nacionais? É possível a administração dos parques em regime de parceria ou concessão à iniciativa privada?

Nós temos várias tipificações de UCs. Temos UCs que são, por exemplo, reservas biológicas, são para fins de estudo. Há algumas UCs onde é possível o acesso público. É importante que a gente tenha esse acesso, como já acontece em algumas reservas e parques nacionais que são frequentados pela população. Há um problema de gestão por conta do déficit de funcionários e do tamanho das nossas UCs, que hoje correspondem, comparativamente, a toda a área utilizada para agricultura no Brasil. Também é necessário que tenhamos parcerias construídas em diálogo com a comunidade, de forma transparente, para que a gestão das nossas UCs seja aperfeiçoada e ganhe em qualidade, inclusive no que se refere ao acesso da população onde for possível.

A grande maioria das UCs pode ser visitada pela população, e o que precisamos garantir é uma gestão que dê conta de recepcionar esse público sem levar à degradação e à perda de biodiversidade nessas áreas. Não somos contra fazer parcerias com a iniciativa privada, mas é preciso que haja um amplo e transparente processo de debate para que a sociedade e os órgãos de controle possam entender que essas parcerias são iniciativas que apontam para uma melhor gestão dessas unidades e para melhores condições de acesso por parte da população.

((o))eco: O programa de governo do PT, assim como todos os outros, fala na necessidade de tornar mais ágil a concessão de licenças ambientais no Brasil. É possível desburocratizar o processo de licenciamento sem que isso reduza o rigor com os possíveis impactos sobre o meio ambiente?

“Muitas vezes há um clamor da sociedade por um determinado serviço derivado de uma obra, e você acaba não tendo a opção de uma observação rigorosa e detalhada e de um diálogo mais amplo sobre tudo que possa ser feito para mitigar os impactos desses empreendimentos.”

Primeiro nós tínhamos um quadro de servidores insuficiente para as demandas que recebíamos. Estamos melhorando esse quadro de servidores, melhoramos os instrumentos do licenciamento e os diálogos com as comunidades atingidas no entorno desses licenciamentos. Não podemos mais continuar agindo por demanda, esse é um problema. Se temos um déficit de energia, logo nós trabalhamos um licenciamento sob pressão. Se tivermos planejamento, o processo de licenciamento não estará sob pressão.

Estamos melhorando o quadro de servidores da área de licenciamento do Ibama, mas também buscando ter um planejamento que nos permita antecipar alguns fatos para deixar de operar sob pressão. Muitas vezes há um clamor da sociedade por um determinado serviço derivado de uma obra, e você acaba não tendo a opção de uma observação rigorosa e detalhada e de um diálogo mais amplo sobre tudo que possa ser feito para mitigar os impactos desses empreendimentos.

Biodiversidade

((o))eco: Por conta da obstrução no Congresso Nacional, o Brasil perdeu a hora de ratificar o Protocolo de Nagoya que, no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) da ONU, pretende regulamentar o acesso aos recursos genéticos e a repartição dos benefícios financeiros derivados de sua utilização. Um Projeto de Lei sobre esse tema foi enviado por Dilma ao Congresso em regime de urgência. Em um eventual segundo mandato, qual será a postura do governo em relação a essa questão?

“O governo federal vem trabalhando para a implementação das 20 Metas de Aichi porque entende que é fundamental que o Brasil tenha protagonismo na defesa da biodiversidade (…). Não tenho dúvidas de que o país já terá alcançado suas metas em 2020.”

O Brasil é signatário do Protocolo de Nagoya e é o país com a maior biodiversidade do planeta. Pelo menos 20% das espécies existentes estão no Brasil, temos uma cobertura de 30% de todas as florestas tropicais do mundo. Então, é necessário que nós tenhamos protagonismo nessa defesa da biodiversidade. A presidenta Dilma foi uma das primeiras chefes de Estado a assinar o Protocolo de Nagoya. Nós o encaminhamos ao Congresso, que é soberano, para ratificação. Lá tem forças que atuam com interesses específicos, mas nós esperamos que esses interesses não se coloquem à frente dos interesses da sociedade brasileira. Nossa expectativa é que o Congresso vá ratificar o do Protocolo de Nagoya e o governo já vem tomando iniciativas para sua implementação.

É necessário também construir instrumentos que garantam a repartição de benefícios do uso da biodiversidade. Para isso, também encaminhamos um Projeto de Lei ao Congresso que trata do acesso aos recursos genéticos e da repartição justa e equitativa dos benefícios derivados de sua utilização. Para se ter uma ideia da importância que o governo dá a este assunto, o PL está sob regime de urgência constitucional.

((o))eco: Em um eventual segundo mandato, como o Brasil fará para cumprir as Metas de Aichi que, no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), traz um conjunto de 20 medidas que os países devem tomar até 2020 para a proteção de sua biodiversidade?

O governo federal vem trabalhando para a implementação das 20 Metas de Aichi porque entende que é fundamental que o Brasil tenha protagonismo na defesa da biodiversidade e de sua importância para a existência de todas as espécies do planeta. Não tenho dúvidas de que o país já terá alcançado suas metas em 2020.

((o))eco: Qual será a posição de um segundo governo Dilma sobre pagamento por serviços ambientais? E sobre instrumentos da chamada “economia verde”, como o REDD+, que prevê compensação financeira por desmatamento evitado?

Hoje nós temos o Bolsa Verde, que atinge 70 mil pessoas e é uma espécie de pagamento por serviços ambientais. A vulnerabilidade social das famílias que o recebem é muito grande, a grande maioria tem uma renda mínima. Mas, precisamos avançar em pagamento por serviços ambientais e, nesta direção, o CAR nos permitirá ter elementos mais claros que definam quais são os serviços ambientais e quem deve pagar por eles. Por exemplo: se há uma área de nascente preservada e ela leva água para um rio que atende a uma hidrelétrica, eu posso definir que quem vai pagar pelos serviços ambientais é o setor elétrico. Isso vale se a água for usada para abastecimento humano, para uso na agricultura. Precisamos ter elementos que garantam que o pagamento por serviços ambientais seja justo e efetivamente efetuado por aqueles que se beneficiam dos serviços ambientais gerados por aquela determinada preservação. A expectativa é que o CAR nos ajude nisso. O pagamento por serviços ambientais hoje é quase um clichê, mas vamos fazer com que ele tenha materialidade e que as pessoas efetivamente saibam como ele funciona e para que serve.

((o))eco: O Brasil é vice-campeão mundial na produção de transgênicos e campeão no uso de agrotóxicos. Na última década, apesar da oposição de setores do governo como o MMA, os transgênicos continuaram a se expandir com o apoio do Ministério da Agricultura e da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). O cultivo e a produção de transgênicos continuarão crescendo no Brasil durante um segundo mandato de Dilma?

“O Plano Nacional de Agroecologia, que prevê uma transição desse modelo químico-dependente para um modelo sustentável. Nós, ambientalistas do PT, apostamos que esse deva ser um caminho trilhado com mais intensidade no próximo mandato. Não é possível que o Brasil continue a ostentar esse título de campeão dos agrotóxicos.”

Nós, ambientalistas do PT, temos uma opinião um pouco diferente da opinião de alguns setores do governo. Para nós, o campo brasileiro está doente, está dependente químico. Quando é assim, é preciso entender a quem isso interessa. Provavelmente, a quem vende o produto químico, pois, para o produtor, não interessa ver o campo doente. O governo brasileiro vem trabalhando propostas alternativas de produção agrícola, como o Plano Nacional de Agroecologia, que prevê uma transição desse modelo químico-dependente para um modelo sustentável. Nós, ambientalistas do PT, apostamos que esse deva ser um caminho trilhado com mais intensidade no próximo mandato. Não é possível que o Brasil continue a ostentar esse título de campeão dos agrotóxicos.

O Plano Nacional de Agroecologia incentiva a agricultura familiar e possibilita ações que reduzem o uso desses compostos químicos na agricultura e melhoram a produtividade. Há muita discussão sobre esse modelo por conta da necessidade de produção em larga escala. Nós temos dados que mostram que a produção da agricultura familiar, por hectare, equivale ao dobro do agronegócio.

Mobilidade urbana

((o))eco: E a mobilidade urbana? Outros candidatos criticam o apoio que o governo Dilma tenta dar à produção nacional de automóveis que estão saturando as cidades…

“O governo tomou a iniciativa de liberar recursos para estados e municípios melhorarem sua mobilidade urbana. São recursos da ordem R$ 140 bilhões, são quase mil quilômetros de transporte sobre trilho (metrô, monotrilho, VLT, trem urbano) e cinco mil quilômetros de transporte por BRT em corredores, além do transporte fluvial.”

Nós precisamos entender que o Brasil sempre foi influenciado por alguns interesses. O modal rodoviário, com a utilização de carros, sempre teve predominância na nossa matriz de transportes. Ainda é muito tímido o nosso transporte sobre trilho, o nosso transporte fluvial. Não à toa, as manifestações de junho de 2013 tiveram no centro de seu impulso exatamente a questão da mobilidade urbana.

O governo tomou a iniciativa de liberar recursos para estados e municípios melhorarem sua mobilidade urbana. São recursos da ordem R$ 140 bilhões, são quase mil quilômetros de transporte sobre trilho (metrô, monotrilho, VLT, trem urbano) e cinco mil quilômetros de transporte por BRT em corredores, além do transporte fluvial. O governo começou a ter um olhar mais dirigido à mobilidade urbana, para garantir que as pessoas possam circular nas cidades de forma mais ágil e com menos transtorno em seu deslocamento. Os resultados já começam a aparecer: as obras de mobilidade da Copa já melhoraram de alguma forma esse deslocamento nas cidades. É preciso avançar, e o próximo governo terá a mobilidade urbana como um dos elementos centrais de sua ação.

((o))eco: É preciso deter a poluição atmosférica nas grandes cidades brasileiras…

Temos também que reduzir a poluição do ar nas grandes cidades. Nós tivemos, por resoluções do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) ou por adequação dos fornecedores de combustíveis, uma redução significativa de emissões. Nós deixamos de emitir 33% de carbono só com iniciativas como reduzir a quantidade de enxofre na gasolina, adicionar biodiesel ao diesel e adicionar álcool à gasolina. Enfim, o governo brasileiro tem tomado iniciativas para a melhora da qualidade do ar.

((o))eco: Em um segundo mandato de Dilma, o MMA continuará sofrendo sucessivos cortes de orçamento ou essa cultura ainda pode mudar dentro do governo?

“Nós temos melhorado o orçamento do ICMBio para regularização fundiária, o instituto tem quase R$ 1 bilhão a sua disposição para isso.”

O MMA não é um ministério de obras. Nós temos a definição de políticas, e muitas vezes elas são executadas por outras áreas. Um exemplo: nós somos coordenadores da Política Nacional de Resíduos Sólidos, mas quem executa financeiramente as ações para essa política são o Ministério das Cidades, o Ministério da Integração Nacional, o BNDES e a Caixa Econômica Federal. Nós temos, como já disse, um programa de incentivo à instalação de placas solares para aquecimento de água, mas quem o desenvolve dentro do programa Minha Casa, Minha Vida é a Caixa Econômica Federal. Enfim, há um conjunto de iniciativas que o MMA adota, com formulações e políticas que são executadas no plano de obras por outros ministérios. Mas, nós precisamos também, até para ter a formulação dessas políticas, melhorar o nosso orçamento.

O MMA é um dos ministérios com a maior taxa de execução do orçamento. Isso indica que ele tem condições de receber mais recursos. Muitos ministérios acabam tendo uma taxa de execução muito baixa, mas esse não é o caso do MMA, que tem uma taxa de execução bem próxima dos 100%. A área ambiental reivindicará – e, com certeza, nós contaremos com a sensibilidade da presidenta Dilma – que seu orçamento ganhe mais força para que nossas ações e formulações de políticas também melhorem.

Nós tivemos alguns avanços, dizer que só reduziu não é verdade. A taxa de fiscalização e licenciamento que o Ibama cobra hoje já representa um valor bastante significativo nos orçamentos dos estados e do próprio Ibama. Nós temos melhorado o orçamento do ICMBio para regularização fundiária, o instituto tem quase R$ 1 bilhão a sua disposição para isso. Então, às vezes você pega um dado do orçamento central do MMA e parece que tem alguma redução, mas no cômputo geral os recursos têm crescido.

 

 

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