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Guarda-parque: uma vocação exercida ao redor do mundo

Sob risco e condições duras, eles trabalham nos parques e áreas protegidas para desenvolvê-las, garantir sua integridade e lidar com o público

Miliany Campos ·
8 de janeiro de 2015 · 9 anos atrás
Guarda-parques de 19 países no Parque Lane Cove River, Sydney, onde se hospedaram, durante o Congresso Mundial de Parques. Foto: Steve Woodhall

O guarda-parque pode trabalhar em funções como manejo de visitantes, educação ambiental, prevenção e combate a incêndios florestais, fiscalização, relacionamento com as comunidades locais, atividades de pesquisa e monitoramento, administração e planejamento, manutenção de infraestrutura, atividades de busca, resgate e primeiros socorros. É um trabalho que requer, além de treinamento e capacitação adequada, comprometimento e paixão pela natureza.

Embora seja uma função nobre e gratificante, na maioria das vezes os guarda-parques enfrentam severas dificuldades, como carência de condições laborais mínimas, baixo reconhecimento social e institucional, carência de treinamentos e capacitação, e alto risco de acidentes e morte.

Meu interesse pela profissão começou quando eu trabalhava no corpo da guarda ambiental, após curso de formação de guarda-parque, no Parque Natural Municipal do Trabiju, um resquício de Mata Atlântica e sítio histórico do município de Pindamonhangaba, interior de São Paulo. No final de 2012, soube da existência da Federação Internacional de Guarda-parques – FIG (International Ranger Federation) e da sua filiada e então recém-fundada Associação Brasileira de Guarda-parques (ABG). Comecei a me envolver com a ABG por meio de trabalhos voluntários, com a participação na administração de seu blog, onde são compartilhados os trabalhos, sucessos e dificuldades enfrentados pelos guarda-parques, tentando estabelecer uma rede maior e mais conectada desses profissionais no país e com a comunidade internacional.

Há alguns meses, a FIG, por meio da Fundação The Thin Green Line, uma entidade sem fins lucrativos que ajuda guarda-parques ao redor do mundo e suas famílias, ofereceu 10 patrocínios para guarda-parques representarem seus países e participarem do Congresso Mundial de Parques da UICN, em Sydney, Austrália, que ocorreu em novembro deste ano. Eu fui selecionada para participar do congresso e representar a Associação Brasileira de Guarda-Parques, oportunidade aproveitada também para levar uma Declaração dos Guarda-parques do Brasil. O documento foi feito de forma colaborativa com os associados, resumindo a situação, opinião e necessidades dos guarda-parques e sua profissão no Brasil.

Em cada país, uma história

“Sothene Ndong Obiang, do Gabão, compartilhou a notícia do assassinato de três colegas na semana anterior”

O Congresso Mundial de Parques reuniu milhares de pessoas do mundo inteiro, com uma programação variada e que incluiu apresentações especiais sobre guarda-parques. Em uma das sessões paralelas, a FIG organizou o evento “Meet a park and protected area ranger“, com guarda-parques de diferentes países. Foi uma chance de entender as diferentes atribuições que um guarda-parque pode desempenhar, e os diferentes desafios enfrentados por cada um deles. Uma das histórias mais duras foi a de Sothene Ndong Obiang, do Gabão, que compartilhou a notícia do assassinato de 3 colegas na semana anterior. Durante todo o congresso, este intercâmbio de informações foi possível e fundamental. O corpo de guarda-parques ao redor do mundo é bastante unido e, por meio das ações que a FIG realiza, ganha visibilidade a importância dos guarda-parques no contexto da conservação mundial.

O congresso foi encerrado após uma cerimônia de premiação, onde foram homenageados os guarda-parques Maximillian Jenes, da Tanzânia, pela luta contra a caça de elefantes; Tiwonge Gawa, do Malauí, pelo trabalho em educação ambiental para conservação de aves no seu país; Luigi Eybrecht, de Bonaire, por superar um histórico de violência doméstica na infância e se tornar comandante do programa Guarda-parque Mírim de Bonaire; e Jobogo Mirindi, da República Democrática do Congo, pelo seu trabalho de conservação integrado com outros países.

Em cada país ou local distinto, os guarda-parques podem desempenhar diferentes funções, algumas vezes mais generalistas, outras mais especializadas. Na Austrália, por exemplo, no estado de Nova Gales do Sul, para se tornar guarda-parque é necessário ter curso superior em Ciências ou área correlata. No caso do Brasil, há muitas pessoas desempenhando funções típicas de guarda-parques em áreas públicas e privadas, em nível federal, estadual e municipal, mas não denominadas como guarda-parques. Apenas em poucos estados ou municípios a profissão é total ou parcialmente regulamentada. Mas seja qual for a denominação recebida e as qualificações requeridas, o importante são as funções que estas pessoas desempenham, pois são elas que definem a condição e figura do guarda-parque.

O Congresso Mundial de Parques mostrou que os guarda-parques têm uma comunidade mundial unida e bem estruturada, que os respalda, facilita intercâmbios, e luta pelo reconhecimento deste trabalho. Para quem se interessar em conhecê-la, em 2016 ocorrerá o Congresso Mundial de Guarda-parques no Colorado, EUA, e as inscrições já estão abertas.

 

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  • Miliany Campos

    Bióloga formada pela Universidade Federal de São Carlos e membro da Associação Brasileira de Guarda-parques

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