Reportagens

Guardian: “2011 reescreveu o livro dos recordes”

Foi um ano problemático, com níveis recordes de gases do efeito estufa, derretimento intenso do gelo Ártico e temperatura em 11º lugar.

John Vidal ·
26 de dezembro de 2011 · 12 anos atrás
The Guardian Environment Network
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População de tigres na Índia aumentou. Uma das poucas boas notícias de 2011. Foto: Brian Gratwicke
População de tigres na Índia aumentou. Uma das poucas boas notícias de 2011. Foto: Brian Gratwicke
Os 41 indicadores sobre o ar e a superfície usados pelo NOAA (Administração Nacional de Atmosfera e Oceanos), órgão americano, mostraram de forma inequívoca que, visto pelas temperaturas do ar e do solo, o mundo continuou a aquecer ao longo de 2011. Em julho, um relatório do NOAA apontou que os últimos 300 meses foram todos de temperaturas acima da média e que os 13 anos mais quentes da história estão entre os últimos 15 anos desde 1997. O ano de 2011 também se destacou nesse sentido, disse o relatório, porque tivemos uma ocorrência de La Niña , um fenômeno natural de resfriamento oceânico que, normalmente, reduziria as temperaturas.

 

Apesar da estagnação ou recessão econômica em diversos países industrializados, as concentrações de CO2, medidas em Mauna Loa, no Havaí, atingiram picos de mais de 394 partes por milhão em maio e estão agora 39% acima do que estavam no início da era industrial, se aproximando do ponto no qual alguns cientistas acreditam que se tornará impossível conter o aquecimento global.

Em setembro, a universidade de Bremen, na Alemanha, relatou que a camada de gelo Ártica atingira uma nova baixa recorde, baseada em dados de um sensor japonês instalado no satélite Aqua, da Nasa. Dias mais tarde, o Centro de Dados para Neve e Gelo dos EUA, usando outros números, relatou um número ligeiramente melhor para a camada de gelo, tornando 2011 o segundo pior ano já medido.

Christophe Kinnard, do Centro de Estudos Avançados sobre Zonas Áridas, em La Serena, Chile, relatou que, em novembro,  ambas a duração e a magnitude do atual declínio no gelo oceânico “parece não ter precedentes nos últimos 1.450 anos”.

“2011 foi descrito por vários comentaristas como o ano do tornado. Entre janeiro e junho, 43 grandes tempestades lançaram quase 1.600 tornados nas regiões Sul, Leste e Central dos Estados Unidos”

Tudo parece estar com tendência para cima – temperatura da superfície, da atmosfera, e também do oceano. Esse último está se aquecendo e levando uma quantidade maior de águas aquecidas e salinas ao Ártico. O gelo oceânico está sendo erodido por baixo e derretido por cima”, disse Kinnard.

Enquanto, em 2010, a Europa Oriental, Rússia, Paquistão e Oriente Médio sofreram os piores eventos de clima extremo, em 2011 foi a vez da América do Norte. O continente experimentou enchentes de grande porte ao longo dos rios Mississippi e Missouri, incêndios recorde e secas incapacitantes no Sul.

 

Em 2011, mais de 2.942 recordes mensais de calor e frio extremos foram quebrados nos 50 estados Americanos, disse o Conselho de Defesa de Recursos Naturais.

Os custos dos desastres relacionados ao clima disparararam. Os EUA experimentaram 14 desastres diferentes, cada um custando mais de US$1 bilhão. No total, as perdas financeiras foram estimadas em US$50 bilhões.

“De várias maneiras, 2011 reescreveu o livro dos recordes. De tempestades de neve desastrosas, ao segundo tornado mais letal já visto, a enchentes épicas, secas e ondas de calor, à terceira mais intensa temporada de furacões já registrada, nós fomos testemunhas de extremos em praticamente todas as categorias de mau tempo”, disse o porta-voz do NOAA, Christopher Vaccaro.

2011 foi descrito por vários comentaristas como o “ano do tornado”. Entre janeiro e junho, 43 grandes tempestades lançaram quase 1.600 tornados nas regiões Sul, Leste e Central dos Estados Unidos. Metade aconteceu em abril e 226 ocorreram em um dia, 27 de abril.

Mas 2011 também foi o ano de água demais ou água de menos. Começou com uma devastadora enchente na Austrália, que cobriu uma área do tamanho da França e da Alemanha combinadas, e acabou com a tempestade tropical Washi matando quase mil pessoas e deixando 300 mil desabrigados nas Filipinas.

As piores enchentes da Tailândia em 50 anos reclamaram 730 vidas, a seca do norte da China, que começou em 2010 e avançou 2011 adentro, foi a pior seca a atingir o país em 60 anos.

Enormes secas afetaram algumas das comunidades mais pobres e mais ricas do mundo. A pior seca em 60 anos atingiu mais de 10 milhões de pessoas e levou a morte de milhares de pessoas e milhões de animais na Somália e no chifre da África.

Entrementes, o Texas foi gravemente atingido por ondas de calor e seca. A cidade de Austin teve 27 dias de temperaturas acima de 100 graus Fahrenheit (37,7 graus Celsius) e 90 dias no total em que a temperatura ultrapassou esse limiar. O Serviço Florestal do Texas disse que secas contínuas mataram entre 100 e 500 milhões de árvores, um número que não inclui as árvores destruídas por incêndios, que incidiram sobre 4 milhões de acres (1,6 milhão de hectares) no estado.

O ano começou e terminou com seca e temperaturas recorde na Europa. A temperatura média no norte da Noruega em novembro foi 5,3 Celsius acima do normal, o rio Danúbio manteve o seu nível mais baixo em 60 anos, e a Alemanha e boa parte do norte da Europa tiverram o ano mais seco desde que os registros começaram em 1881.

2011 foi também um ano de terremotos excepcionais. Nas sete semanas entre 01 de janeiro e 21 de fevereiro, Argentina, Chile, Irã, Paquistão, Tajiquistão, Tonga, Burma, Ilhas Salomão, Sulawesi, Fiji e Nova Zelândia foram todos atingidos.

Mas, de longe, o terremoto de maior estrago foi o do Japão, que levou ao tsunami letal de março de 2011. Ele matou 15.500 pessoas, causou o derretimento de três reatores nucleares na usina de energia Fukushima Daiichi e fez com que 160 mil pessoas fossem obrigadas a fugir ou ser retiradas da área. Ao final do ano, estima-se que o custo tenha chegado a cerca de 210 bilhões de dólares em danos físicos e produção perdida. Estima-se que a desativação da usina custe outros 15 bilhões de dólares.

O debate sobre os níveis de radiação ainda está quente, mas enquanto a indústria, apoiada por comentaristas ocidentais, minimizou as consequências, mostrou-se que os níveis de césio radioativo atingiram 50 milhões de vezes os níveis normais fora da costa da região. À medida que 2011 terminava, ainda estava difícil medir com precisão o grau de devastação, o quanto derreteram os reatores e os níveis exatos de radiação. Na semana passada, o primeiro ministro japonês, Yoshihiko Noda, disse que os donos da usina finalmente tinham conseguido trazer a usina para um estado conhecido como “fechamento frio”.

Uma consequência clara do desastre de Fukushima foi levar países europeus a darem as costas à energia nuclear. Principalmente, Angela Merkel, chanceler da Alemanha, disse em maio que implementaria até 2022 o fechamento progressivo das usinas nucleares alemãs. Os italianos votaram esmagadoramente contra novos reatores e o governo suíço decidiu desligar progressivamente os seus.

“Ambientalistas na batalha global contra a perda de florestas receberam bem os dados de satélite do Brasil mostrando que o desmatamento na Amazônia caiu para o menor nível em 23 anos. “

Pelo lado das notícias boas. Em julho, o Programa Ambiental das Nações Unidas anunciou que os investimentos em energias renováveis cresceram 32% em 2010, atingindo um recorde de 211 bilhões de dólares desde 2004. Pela primeira vez, esse investimento nos mais dinâmicos países em desenvolvimento foi maior do que aquele ocorrido nos países desenvolvidos.

O serviço da Bloomberg de Finanças para Novas Energias disse que os investimentos em energia renovável devem dobrar nos próximos oito anos e atingir 395 bilhões de dólares ao ano em 2020. As más notícias são que a Agência Internacional de Energia (IEA) afirmou que isso não será suficiente para estabilizar as emissões e controlar a mudança climática.

O senso de realismo da Agência Internacional de Energia foi realçado na conferência das Nações Unidas sobre o clima, em dezembro. As negociações em Durban, África do Sul, evitaram um racha maior entre os grandes emissores e os demais países, com um acordo entre 194 países para trabalhar em direção a uma proposta com força de lei para cortar as emissões no futuro. No entanto, o encontro terminou com apenas promessas de cortes voluntários pelo momento.

“Sem um compromisso muito mais forte para os próximos 5-10 anos, o resultado de Durban vai deixar nada além de fumaça e espelhos – uma ilusão de ambição sem objetivos reais ou datas de implementação claras”, disse Nnimmo Bassey, chefe do Friends of the Earth International.

Negociadores também se concentraram em estabelecer mercados de carbono para proteção de florestas e transporte.

Ambientalistas na batalha global contra a perda de florestas receberam bem os dados de satélite do Brasil mostrando que o desmatamento na Amazônia caiu para o menor nível em 23 anos. Porém, novas leis passadas em Dezembro, se confirmadas, permitirão aos ruralistas derrubar mais árvores próximas aos rios e topos de morro das bacias hidrográficas.

Tigres e outros animais carismáticos da megafauna aparentemente se saíram melhor em 2011. Camboja, Índia, Indonésia, Laos, Burma e Nepal protegeram mais 2 milhões de hectares de terra para tigres. A Índia – onde está metade dos tigres do mundo – estimou que a população aumentou de 1.411, em 2007, para atuais 1.706. Entretanto, a WWF anunciou que somente 18 a 22 tigres siberianos sobrevivem em áreas selvagens no Norte-Leste da China.

Inesperadamente, houve um aumento significativo da população de gorilas registrada nas montanhas Virunga, que se dividem entre Ruanda, República Democrática do Congo e Uganda. Um levantamento do WWF contou 480 indivíduos, um aumento de 100 desde a última contagem de 2003.
Em outro pequeno triunfo para a conservação, o programa de Desenvolvimento das Nações Unidas anunciou em dezembro que arrecadou-se mais de 100 milhões de dólares, principalmente em países latino-americanos, para, temporariamente, deixar sob o solo 900 milhões de barris de óleo no parque nacional do Yasuni, na Amazônia Equatoriana.

 
*Esse artigo foi publicado pela Guardian Environmental Network, da qual ((o))eco faz parte. O texto original (em inglês) pode ser lido aqui.

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