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Ruralistas pedem anistia irrestrita

Na reta final do debate sobre novo Código Florestal, bancada no Senado ameaça acordo feito com relator Jorge Viana e apresenta emendas para ampliar perdão a crimes ambientais.

Daniele Bragança · Gustavo Faleiros ·
23 de novembro de 2011 · 12 anos atrás

Jorge Viana (de pé): “Eu não sei se eu dei conta do recado, mas eu tentei”
Jorge Viana (de pé): “Eu não sei se eu dei conta do recado, mas eu tentei”
Depois de intensas discussões durante toda a manhã e parte da tarde, foi aprovado na Comissão de Meio Ambiente do Senado o relatório de Jorge Viana (PT/AC) de mudança do novo Código Florestal. O texto base, no entanto, recebeu propostas de modificação que serão discutidas na manhã desta quinta-feira. A bancada ruralista pede que o benefício do perdão das multas seja concedido não somente a pequenos agricultores, mas a todos os produtores rurais.

“Estamos possibilitando tirar a multa para todos os produtores, porque nunca vi um crime… Para quem mata uma criança a pena tem que ser menor do que para quem matou um adulto? Crime é crime. Se praticou um crime ambiental e o pequeno vai poder se recuperar, por que o grande não? Crime ambiental ou qualquer crime não tem cor, não tem raça, não tem gênero, não tem riqueza e não tem pobreza. Direito é direito. Lei é lei,” disse a senadora Kátia Abreu (PDS-TO).

Senadora Kátia Abreu. Foto: Márcia Kalume/ Agência Senado
Senadora Kátia Abreu. Foto: Márcia Kalume/ Agência Senado
Ela e outros senadores ameaçaram votar contra o texto do relator da Comissão de Meio Ambiente (CMA) na votação do Plenário, o que levaria a proposta original da Câmara dos Deputados, relatada por Aldo Rebelo, à sanção presidencial. A presidente Dilma, no entanto, tem desde a campanha presidencial de 2010 afirmado que vetaria qualquer forma de anistia a desmatadores. Até o momento, o governo federal não interfere claramente no debate da Câmara, mas emitiu sinais que aprova os mecanismos de incentivos para a legalização de produtores introduzidos no texto de Jorge Viana

Após a manifestação de Abreu, o relatório recebeu emenda conjunta que modificou pontos que contrariavam os ruralistas (veja aqui a emenda). O ponto principal que desagradou a bancada trata principalmente da aplicação de multas em propriedades rurais e nas regras para a consolidação da produção de alimentos Áreas de Preservação Permanente (APPs), como margens de rios e topos de morros.

A emenda conjunta altera o parágrafo nono do artigo 41, que limitava o governo a implantar programa para conversão de multas por crime ambiental apenas para propriedade rural familiar ou propriedades de até 4 módulos. Pela emenda, o beneficio seria expandido para qualquer propriedade rural, desde que o desmatamento ilegal tenha sido feito antes de 22 de julho de 2008, data do Decreto nº 6514, que regulamenta a lei de crimes ambientais.

A proposta foi criticada pelas organizações não governamentais que durante toda a sessão mantiveram um canal de transmissão através do site Floresta Faz Diferença. O ex-diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro Tasso Azevedo afirmou que a emenda apresentada por Luiz Henrique da Silveira representava anistia de fato a todos os desmatadores. “Por enquanto o jogo está 5 a 1 para eles”, disse Azevedo. Segundo ele, o único ponto positivo na emenda é a unificação do Documento de Origem Florestal (DOF) entre os estados.

Assim como aconteceu com a votação dos destaques do texto de Luiz Henrique, relator das comissões de Agricultura e Ciência e Tecnologia, a votação de hoje foi de quase unanimidade: apenas o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) votou contra.

A bancada ruralista, representada pelos senadores Blairo Maggi (PR-MT), Waldemir Moka (PMDB-MS), Acir Gurgacz (PDT-RO), Jayme Campos (DEM-MT) e Kátia Abreu (PSD-TO) fizeram apelo para que o acordo acontecesse e que fosse votado logo o substantivo de Jorge Viana, sempre enfatizando em suas falas que o texto não era o ideal, mas o “possível”. ”Os produtores rurais nunca ficarão totalmente satisfeitos, mas é o que pôde ser negociado. Não seremos birrentos”, declarou a presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Viana abriu os trabalhos da comissão elogiando a participação de todos. “Eu não sei se dei conta do recado, mas eu tentei”, disse ao relatar que passou noites em claro nos momentos de negociação do Código Florestal .
Por outro lado, senadores como Lindbergh Farias (PT-RJ), Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Marinor Brito (PSOL-PA) insistiram para que o presidente da Comissão, Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), adiasse a votação da matéria para que se tivesse tempo para discutir as mudanças propostas no texto.

Os destaques ficaram para ser apreciados amanhã, a partir das 8:30h da manhã.

*Com informações da Agência Senado

  • Daniele Bragança

    Repórter e editora do site ((o))eco, especializada na cobertura de legislação e política ambiental.

  • Gustavo Faleiros

    Editor da Rainforest Investigations Network (RIN). Co-fundador do InfoAmazonia e entusiasta do geojornalismo. Baterista dos Eventos Extremos

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