Reportagens

O PL segundo o Governo

Ministério do Meio Ambiente responde às críticas da colunista Maria Tereza Pádua ao Projeto de Lei que regulamenta a exploração das florestas públicas.

Tasso Rezende de Azevedo ·
31 de março de 2005 · 19 anos atrás

No dia 20.03 o site O Eco publicou o artigo “Projeto de Risco” de autoria da Sra. Maria Tereza Jorge Pádua em que critica o Projeto de Lei 4776/2005 que tramita em regime de urgência constitucional no Congresso Nacional.

O Projeto de Lei 4776/2005 regulamenta a Gestão de Florestas Públicas para uso sustentável no Brasil e cria o Serviço Florestal Brasileiro e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal.

O debate construtivo sobre o Projeto de Lei nos parece bastante saudável e necessário e para tanto achamos fundamental esclarecer vários pontos levantados que nos parecem tratados de forma inadequada pela autora.

O Projeto de Lei de Gestão de Floretas públicas é um divisor de águas na gestão deste enorme patrimônio brasileiro. Ela é parte de uma estratégia maior de prevenção e combate ao desmatamento e de valorização e integração da sustentabilidade ambiental no processo de desenvolvimento do país.

A proposta do PL leva para o Congresso a consolidação de das propostas de técnicos, ambientalistas, empresários, trabalhadores, pesquisadores e comunidade tradicionais sobre como gerir as florestas públicas brasileiras garantindo soberania, sustentabilidade e desenvolvimento social.

Neste contexto, respondemos e esclarecemos a seguir as críticas e questionamentos apresentados pela autora.

1. O processo de consulta com a sociedade

O artigo afirma que: Uma crítica que pode ser feita é sobre a falta de uma ampla discussão com a sociedade de um projeto de lei (…) Embora muitas instituições (até a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, SBPC) e especialistas tenham protestado, a ampla discussão pública, que tanto prega o PT, restringiu-se aos interessados no assunto, em especial ao Ministério do Meio Ambiente.

O Projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas foi elaborado num processo que começou em Dezembro de 2003. Um grupo de trabalho envolvendo 90 participantes representando governo federal (incluindo 5 ministérios), governos estaduais, ONGs, movimentos sociais, setor privado e instituições de ensino e pesquisa estiveram reunidos em 4 oportunidades em reuniões de 2 dias para estruturar o projeto de lei.

Como subsidio para o trabalho deste grupo foram realizados estudos aprofundados dos sistemas de gestão de florestas públicas de dezenas de países bem como revisada a experiência brasileira com regulação de diversos setores como petróleo, energia, transportes, mineração, água e comunicações.

Um Seminário Internacional sobre gestão de florestas públicas foi realizado em fevereiro de 2004 em Belém contando com 250 participantes.

Foram elaboradas 4 versões estruturais do projeto de lei, que tiveram mais de 20- revisões e passaram por um extenso processo de consulta. Foram envolvidas no processo de consulta mais de 1200 instituições. Duas dezenas de reuniões setoriais de consulta envolvendo ONGs, movimentos sociais, setor privado e governos estaduais foram realizadas. Mais de 700 emendas foram recebidas e analisadas, uma a uma, pela equipe do Programa Nacional de Florestas.

O projeto de lei foi analisado pela Comissão Coordenadora do Programa Nacional de Florestas (CONAFLOR) em três oportunidades, inclusive uma reunião extraordinária convocada especificamente para discussão do Projeto de Lei.

Após a consulta o Projeto de Lei passou por um extenso processo de discussão e internalização dentro do Governo. Neste processo preservou-se toda a estrutura central da proposta construída em consulta com a sociedade. Finalmente, em fevereiro de 2005 o projeto foi encaminhado ao Congresso Nacional.

2. O papel das Florestas Nacionais

O texto afirma que: A proposta ignora as Florestas Nacionais já estabelecidas, que somam 19 milhões de hectares e que nunca puderam ser objeto de concessão por motivo de regularização fundiária e por falta de planos de manejo. Mas está claro que as Florestas Nacionais deverão ser passíveis de concessões florestais, pelo menos parte delas.

As Florestas Nacionais e Estaduais têm papel fundamental da estratégia de gestão de florestas públicas. Por isso, o governo federal vem atuando de forma coordenada na criação de novas unidades e na sua implementação. Nos últimos dois anos foram criadas 6 novas FLONAS e se constitui mais Conselhos Consultivos e se preparou mais Planos de Manejo que em toda a história anterior do IBAMA.

A execução dos Planos de Manejo, especialmente no caso de produção florestal, esbarra em uma série de limitantes de regulamentação que o PL procura tratar. Por isso, o PL considera explicitamente as Florestas Nacionais, dedicando inclusive artigos e salvaguardas específicas a estas unidades de conservação. O PL 4776/2005 prevê, exclusivamente para o caso das FLONAS, a Gestão Direta do poder público e, como produto da experiência do IBAMA, permite contratos de mais longo prazo para os prestadores de serviço.

O texto também apresenta a seguinte afirmação: (…) projeto de lei que muda todas as regras de concessões florestais existentes e cria um serviço específico para fazer a gestão de florestas

O PL de Gestão de Florestas Públicas apresenta como uma das opções de gestão das florestas públicas o mecanismo de concessão. Não altera o sistema de concessão atual porque simplesmente não existe regulamentação para concessões florestais no Brasil. A forma como se tem feito a gestão de florestas públicas tem sido a privatização, com risco a soberania e a conservação do patrimônio floresta brasileiro.

A proposta do PL 4776 prevê três modalidades de gestão, todas sem a possibilidade de privatização: (i) criação e gestão de unidade de conservação; (ii) destinação para uso das comunidade locais; (iii) concessão do manejo florestal através de licitação pública e pagamento pelo uso dos recursos. Os dois primeiro mecanismos devem preceder a definição de áreas de concessão.

3. A questão das Terras Públicas

Afirma a autora: Esse projeto parece estar inspirado na moda (por exemplo, do Peru e Bolívia e antes do Chile, entre outros) de criar uma entidade do governo para manejar de forma empresarial o processo de licitações, concessões e contratos com o setor privado que aproveita recursos florestais, que são do Estado. Nesses países, em especial no Peru e na Bolívia, praticamente não existem florestas naturais privadas. Processos de reforma agrária drástica, pela sua própria história, fazem com que quase 100% da Amazônia sejam terras públicas, excluindo as que foram concedidas como propriedades para se fazer agricultura ou pecuária. Por isso, nesses países, o problema do mecanismo de uso das florestas por particulares é complexo. Lá existem leis florestais recentes que estipulam as bases do manejo florestal. Assim, as normas das entidades que fazem a gestão, também muito recentes, limitam-se a questões de administração das relações com as empresas privadas.

Este parágrafo sugere que a questão da gestão de florestas pública não seria um problema tão grave no Brasil porque o país não teria uma área expressiva de florestas públicas como ocorre em outros países. É preciso portanto esclarecer a realidade da Amazônia Brasileira onde pelo menos 75% de seus mais de 5 milhões de Km2 são terras públicas, sendo 30% em áreas protegidas e 45% em áreas não protegidas, arrecadadas ou devolutas. Trata-se da maior área de florestas do mundo sem regulamentação para o uso sustentável.

Mas este não é um privilégio do Brasil. A grande maioria dos países do mundo as florestas privadas são a minoria. E tem sido assim por centenas de anos e a experiência de gestão destas florestas vem de longa data com dezenas de lições aprendidas.

Para subsidiar a PL de Gestão de Florestas Públicas a equipe do Programa Nacional de Florestas estudou os sistema de gestão de diversos países do mundo, desde o sistemas de gesto direta realizados em países como a Polônia, aos sistemas de concessão aplicados no Canadá, Bolívia, Peru e Guatemala, e os sistemas mistos como na Austrália. A este estudo se somou aos resultados do Seminário Internacional de Gestão de Florestas Públicas realizado em fevereiro de 2004 em parceria pelo MMA, o IBAMA e a EMBRAPA que contou com mais de 250 participantes.

Este processo permitiu formular um projeto de lei que incorpora as lições aprendidas dos diversos sistemas permitindo criar um modelo brasileiro para a gestão. Não trata-se de seguir “a moda” e sim de ter a serenidade de tirar lições das experiências de outras regiões e outros setores.

É preciso também reconhecer a estrutura institucional que foi criada nos últimos anos em países como Bolívia e Peru para tratar da Gestão das Florestas Públicas. Ela inclui agências reguladoras, institutos de pesquisa, órgãos de fomento e órgãos ambientais de licenciamento e monitoramento. Referir-se a este arcabouço institucional como uma entidade de governo para manejar licitações é no mínimo ingênuo.

4. Os papéis do IBAMA e do Serviço Florestal Brasileiro

Afirma a autora: (O PL) Esquece a existência do Ibama, embora deixe com ele todos os ônus da fiscalização, criação e manejo das Florestas Nacionais, Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável. Parece que o novo Serviço Florestal só terá o “filé mignon” da questão, que é a exploração florestal pelo setor privado.

O Projeto de Lei prevê a criação do Serviço Florestal Brasileiro que terá três funções básicas: (i) atuar como órgão gestor do sistema de concessões; (ii) fomentar o desenvolvimento florestal sustentável no Brasil e (iii) gerir o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal.

As funções de órgão gestor do sistema de concessões e a do Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal eram inexistentes e são criadas a partir do PL. A função de fomento ao desenvolvimento florestal sustentável é função da diretoria de florestas do MMA. Portanto o Serviço Florestal Brasileiro não assume atribuições do IBAMA.

A função de gestor do sistema de concessões precisa ser realizada por um órgão independente. Não é possível que o mesmo órgão que processa a concessão seja responsável pelo licenciamento das atividades. Seria um enorme conflito de interesses. Raciocinando pelo absurdo, seria o mesmo que ter como parte do IBAMA as funções da ANA, ANP, DNPM entre outros órgão reguladores e gestores.

Vale notar que no processo de formulação do PL se reconheceu ser fundamental o fortalecimento do IBAMA para que esteja capacitado e estruturado para atender as demandas oriundas das concessões. Neste sentido o Programa Nacional de Florestas, gerido pela Secretaria de Biodiversidade e Florestas do MMA, dobrou o orçamento destinado a Diretoria de Florestas do IBAMA para o ano 2005. Além disso ainda no primeiro trimestre deste ano estarão sendo abertas no IBAMA 900 vagas através de concurso público, incluindo 150 engenheiros florestais, num claro processo de fortalecimento do setor florestal do IBAMA.

5. A estrutura institucional de gestão

Maria Tereza também afirma que: O texto ora apresentado é complexo, contraditório e confuso. Por exemplo, estabelece uma profusão de conselhos, diretorias, um Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF), novos cadastros e registros. Além do mais, vai precisar de uma enorme regulamentação. O pior é que não é atraente para o setor privado, que requer regras claras, pois é uma legislação praticamente impossível de se cumprir e de alto risco para os investidores.

O Projeto de Lei tem sim um grau de complexidade, que é compatível com o desafio da gestão das florestas públicas de forma que garanta a soberania, controle e sustentabilidade.

As funções e funcionamento dos órgãos responsáveis pela gestão das floretas públicas são descritos em um Título específico do projeto de lei, de forma bastante clara e organizada.

O PL conta com uma estrutura institucional formulada durante o longo processo de consulta pública que visa garantir a transparência e o controle social. Na esfera federal prevê na estrutura do Ministério do Meio Ambiente as seguintes funções: Serviço Florestal Brasileiro – funcionamento como órgão de gestão gestor do sistema de concessões; o IBAMA – como órgão licenciador e fiscalizador do manejo florestal e gestor das unidades de conservação; o Conselho Gestor de Floretas Públicas – órgão consultivo com participação da sociedade e governo para propor diretrizes para gestão de florestas públicas.

O PL prevê como um dos princípios de gestão das florestas públicas no inciso IX do artigo 2º: “IX garantia de condições estáveis e seguras que estimulem investimentos de longo prazo no manejo, na conservação e na recuperação das florestas”. O setor privado participou ativamente de todo o processo de consulta e tem dado demonstrações claras de apoio ao projeto através de entidades representativas tais como UNIFLOR, ABIMCI, AIMEX, Fórum de Base Florestal, ABRAF, SBS, Bracelpa e ABIPECH entre outros.

6. A área de abrangência da Lei e seu significado

Diz a Maria Tereza: É interessante notar que, levando em conta o que se menciona abaixo, esta lei deverá administrar uma porcentagem mínima das florestas naturais. Do total de florestas naturais do país, podemos inferir as seguintes dificuldades: As florestas da Mata Atlântica não podem, por lei, ser exploradas ou, tecnicamente, não devem ser exploradas; As florestas do Cerrado e da Caatinga, assim como as do Sul, que são florestas residuais ou em extinção, não deveriam ser exploradas; As matas das Florestas Nacionais já estabelecidas na Amazônia, em geral, não podem ter concessão por causa da situação fundiária. Poder entregá-las em concessão implica, previamente, em um esforço de saneamento legal que não foi feito em décadas; O Projeto de Lei não trata das florestas naturais das reservas indígenas, que somam mais de 110 milhões de hectares. A Lei não precisa tratar de florestas naturais em Reservas Extrativistas, em Áreas de Proteção Ambiental ou em Reservas de Uso Sustentável, pois o essencial das regras para as mesmas já existe na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e no seu decreto de regulamentação.
Em conseqüência, não fica claro por que fazer uma Lei tão complexa para uma fração relativamente pequena das florestas naturais passíveis de concessão.


Apenas na Amazônia, excluindo-se as áreas as áreas privadas (25%) e as áreas protegidas, incluindo Terras Indígenas e Unidades de Conservação (30%), existem pelo menos 220 milhões de há de florestas públicas. Esta área, que equivale a quase a totalidade de florestas dos Estados Unidos ou Canadá, trata-se da maior floresta do mundo sem regulamentação. Se fossem as florestas de um país seria a 4ª maior área florestal do mundo.

O PL 4776 prevê a gestão de uso sustentável para produtos madeireiros e não madeireiros e serviços. Na mata atlântica e no cerrado obviamente não será possível a produção madeireira, mas certamente o turismo, a restauração e recuperação de áreas degradadas e até a produção de produtos não madeireiros tais como piaçava, frutos e plantas medicinais podem ser uma opção. É por isso que tanto a Rede Cerrado como a Rede Mata Atlântica acompanharam de perto todo o desenvolvimento do Projeto de Lei.

Quanto a Caatinga é preciso reconhecer o enorme potencial de manejo floresta deste ecossistema e as várias experiências desenvolvidas que demonstram a viabilidade ecológica, social e econômica da atividade florestal madeireira e não madeireira na região. Na caatinga foi estabelecida a primeira floresta nacional de país, na Chapada do Araripe, onde hoje existe um importante projeto de produção de pequi com envolvimento da comunidade local. Também neste bioma estão os primeiros planos de manejo do Brasil a iniciarem o segundo ciclo de corte. Dezenas de instituições trabalham no desenvolvimento do Rede de Manejo da Caatinga que envolve MMA, IBAMA, EMBRAPA, Universidades e ONGs. Por isso também a Articulação do Semi-Arido (ASA) acompanhou de perto o desenvolvimento do PL.

O Projeto de Lei de Gestão de Florestas propõe que as Floretas Públicas devem permanecer florestas e públicas. E isso vale para todos os biomas.

7. Quanto as regras de manejo florestal

O texto afirma que: O projeto não estabelece pautas claras ou identificáveis de sustentabilidade da exploração florestal, o que é gravíssimo conhecendo a realidade atual da exploração florestal, meramente extrativa (só menciona, profusamente, a palavra “sustentável”).

É preciso compreender a hierarquia da legislação e a lógica de gestão. O PL 4776/2005 não trata da regulamentação das práticas de manejo florestal. Estas são reguladas pelo Código Florestal e o Decreto 1.282/1994 além das instruções normativas e portarias específicas emitidas pelo MMA e o IBAMA. O PL estabelece claramente que cada concessão deverá ter seu plano de manejo analisado e aprovado pelo IBAMA ou órgão ambiental competente.

Aliás, as regras mínimas para os Planos de Manejo na Amazônia, descritas na Instrução Normativa No 4 do MMA, estão passando por um completo processo de revisão iniciado em outubro de 2004 e que encontra-se no processo de consulta pública.

Vale lembrar que já existem na Amazônia mais de 1,1 milhões de hectares de florestas naturais manejadas segundo os rígidos padrões internacionais de certificação do FSC. Portanto não trata-se de uma utopia como faz parecer o texto acima.

A autora continua com as seguintes críticas:
Não estabelece rotação florestal mínima (por exemplo, 30-40 anos), nem normas de exploração anual. Isso não incentiva o manejo, que sempre é de longo prazo.
Ao contrário, fixa prazos de 10 anos previstos para a gestão direta – quer dizer aqueles contratos feitos com não-governamentais, OSCIPs e empresas – e 20 anos máximos previstos para os contratos exclusivos para a exploração dos serviços florestais.
Não explica quem vai financiar ou fazer os estudos dos impactos ambientais provenientes do manejo florestal nas Florestas Nacionais com matas naturais.
Nem fala da certificação florestal, tão em moda e fundamental para fins de exportação e mesmo de usos internos corretos, sob o ponto de vista legal e técnico.
Nem menciona a obrigatoriedade, ou pelo menos, os incentivos para associar a exploração florestal ao uso industrial in situ (levar a indústria para a mata), para impulsionar o desenvolvimento e o emprego na região onde o empreendimento se localiza.
Não menciona as formas admissíveis de extração da madeira, que deveriam evitar a abertura de estradas e clareiras, para a extração de poucas toras ou árvores, nem outras, para se prejudicar menos a cobertura florestal. A extração de árvores menos danosa e também a mais cara é por helicóptero. O transporte da madeira em toras, na Amazônia, deve ser por rios, para se evitar a necessidade de construção de estradas, entre outras medidas de menor impacto.
Não fala do leque de espécies (comerciais e ainda não comerciais) a serem exploradas.
Não faz restrições a espécies endêmicas e ameaçadas de extinção e nem apresenta formas de salvaguardá-las em suas áreas de ocorrência.

Vamos as observações sobre cada ponto:

Rotação Florestal Mínima – este um conceito aplicado em florestas plantadas, no caso de manejo de florestas naturais se utiliza o termo ciclo de colheita. Ele não é fixo porque varia de acordo com as espécies, produtos, intensidade de colheita e região manejo. Por exemplo: a extração de óleo de copaíba exige um ciclo de 3 anos; a produção de madeira de uma área onde se extraiu 20 m3 por hectare e a taxa de crescimento corresponde a 0,8 m3/ha/ano para as espécies extraídas, terá um ciclo previsto de 25 anos. Por isso o Projeto de Lei prevê é que a concessão deve envolver pelo menos um ciclo de colheita do produto com maior ciclo previsto.

Prazos de contrato – a Sra. Maria Tereza confunde duas partes bem distintas do projeto de lei. O prazo máximo de concessão está definido nos artigos 35 e 36 sendo 20 anos para serviços e 60 anos para produtos. O prazo de 10 anos refere-se a contratos firmados entre o IBAMA e prestadores de serviço (ex. inventário e tratamentos silviculturais) no caso de Gestão Direta em unidades de conservação.

Monitoramento do Impacto Ambiental – embora não dê para entender o termo “estudos de impacto ambiental provenientes do manejo” pode-se inferir que a autora faz referência a responsabilidade pelo monitoramento dos impactos ambientais do manejo florestal. Esta previsão está contida nos artigos 31 e 32 do PL que tratam das obrigações do concessionário.

Certificação – A certificação florestal é um mecanismo voluntário de avaliação do manejo florestal e não pode ser incluído como obrigação na legislação. Porém, o PL reconhece a importância da avaliação independente e no artigo 43 estabelece a obrigatoriedade de auditorias independentes pelo menos a cada 5 anos.

Incentivos para associar industrialização local – Este é um princípio fundamental expresso logo no Inciso II do Art. 2º: “Art. 2º Constituem princípios de gestão de florestas públicas (…) II – a promoção do processamento local e o incentivo ao incremento da agregação de valor aos produtos e serviços da floresta, bem como à diversificação industrial, ao desenvolvimento tecnológico, à utilização e à capacitação de empreendedores locais e da mão-de-obra regional”. Um dos grandes avanços do PL em relação a legislação de outros países está em proporcionar mecanismos que permitam incentivas a maximização do beneficio socioeconômico local. No artigo art. 27 prevê que na seleção das melhores propostas nas licitações de concessão deverá ser utilizado como critério além do preço, o menor impacto ambiental, os maiores benefícios sociais diretos e a maior eficiência.

Normas de manejo florestal – como visto acima as normas de manejo são definidas por legislação específica e deverão ser aplicadas em todas as áreas de manejo. Existe uma enorme gama de conhecimento nesta área e já traduzido na legislação especifica.

Leque de espécies a serem exploradas e restrições a espécies ameaçadas – não se pode falar em leque de espécies a serem exploradas na lei uma vez que elas variam imensamente de região para região, de uma unidade de manejo para outra e de mesmo de um talhão para outro. O PL prevê que cada unidade de manejo deverá ter a anuência prévia do órgão ambiental antes de ser licitada. Tanto o edital de licitação como o contrato de concessão deverão especificar os produtos e serviços que poderão ser explorados e aqueles a serem excluídos. Já a regulamentação de planos de manejo florestal prevê as necessárias salvaguardas as espécies endêmicas, raras e ameaçadas.

A Sra. Maria Tereza afirma que o PL (…) não estabelece os mecanismos que permitiriam aos empresários fazer um plano de manejo razoável:
Não se dá a possibilidade de que os interessados do setor privado estudem previamente as áreas;
• O projeto não esclarece como vai ser correlacionado o plano de manejo das Florestas Nacionais estabelecidas ou criadas pelo Poder Público com o plano de manejo florestal do lote da empresa;
Não fica claro quem (Ibama ou SFB) vai aprovar e controlar o cumprimento do plano de manejo florestal e das condições contratuais.

Novamente, analisamos cada um dos pontos levantados:

Acesso às Unidade de Manejo para estudo prévio da área: O acesso as unidade de manejo é livre. O PL prevê – e daí talvez venha interpretação acima – que o poder público disponibilizará, no edital, dados sobre o inventário amostral. Isso é importante para que diminuir a assimetria de informações entre os participantes da licitação, aumentando a competição e minimizando influência dos mais interessados mais capitalizados. Vale lembrar também que o Plano de Manejo é realizado depois que o vencedor da concessão assina o contrato portanto tem total acesso a área de manejo.

Relação com Planos de Manejo das Flonas: o PL prevê explicitamente no art. 49 que as concessões só poderão ocorrer em Florestas Nacionais após a aprovação do Plano de Manejo da Unidade de Conservação. Os Planos de Manejo Florestal serão analisados pelo IBAMA que é o gestor dos Planos de Manejo das FLONAS portanto não existe possibilidade de haver desconexão entre um plano e outro.

Papel do fiscalização e controle dos Planos de Manejo: o artigo 54 explicita que o IBAMA é responsável por “I – Aprovar e monitorar o plano de manejo florestal sustentável da unidade de manejo das florestas públicas”. Já o artigo 57 explicita que o órgão gestor (exercido pelo Serviço Florestal Brasileiro no âmbito federal) será responsável por “VI – gerir e fiscalizar os contratos de concessão florestal”.

8. Conclusão…

O Projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas é fundamental para o ordenamento do uso e conservação de grande parte das florestas brasileiras garantindo que florestas públicas permaneçam florestas e públicas.

O pior risco que sofrerá o projeto é ser desfigurado por emendas que desfaçam as amarrações que visam garantir a gestão de florestas públicas com coerência, transparência, controle social e sustentabilidade.


Nota: O Texto completo do Projeto de Lei, as propostas de emendas apresentadas no congresso e outras sobre o PL 4776/2005 podem ser encontradas no site: http://www.mma.gov.br/projeto_lei.html


* Tasso Rezende de Azevedo é Diretor do Programa Nacional de Florestas do Ministério do Meio Ambiente

  • Tasso Rezende de Azevedo

    Engenheiro florestal, consultor e empreendedor social em sustentabilidade, floresta e clima, além de coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima

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