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Governo reduz Jamanxim em 57% para resolver caos fundiário

Floresta Nacional no Pará sofre pressão para ter seus limites desde que foi criada, há 10 anos. Redução favorece posseiros. ICMBio alega que conflitos diminuirão

Daniele Bragança ·
22 de dezembro de 2016 · 7 anos atrás
Gados dentro da Flona de Jamanxim, em setembro de 2009. Foto: Nelson Feitosa/Ascom Ibama.
Gados dentro da Flona de Jamanxim, em setembro de 2009. Foto: Nelson Feitosa/Ascom Ibama.

O governo escolheu reduzir o tamanho da Floresta Nacional do Jamanxim (Flona), localizada em Novo Progresso, no Pará, para resolver o caos fundiário da região. Criada em 2006 dentro de um pacote para conter o desmatamento ao longo da BR-163, que estava sendo asfaltada, a unidade é uma criança de 10 anos com problemas de 500: convive com ilegalidades que vão de grilagem de terra à garimpo ilegal.

O ICMBio discute internamente há anos como resolver o impasse em torno da floresta nacional mais desmatada do país. Desde agosto, o Ministério Público Federal lançou alertas contra a redução da Flona, que agora se confirma. Ontem, o presidente Michel Temer publicou a medida provisória 756, diminuindo em 743.540 mil hectares a área protegida. Antes, a floresta ocupava 1.301.120 mil hectares. Era a maior do país sob o domínio do Instituto Chico Mendes. A redução da área foi de 57%.

Em parte do local reduzido foi criado uma Área de Proteção Ambiental, a de Jamanxim, categoria menos restritiva dentro do Sistema Nacional de Unidades de Conservação que permitirá que os posseiros continuem no local. Mas isso não significa que o passivo fundiário tenha sido resolvido: cerca de 20% dos ocupantes ainda estão dentro dos novos limites da Floresta.

O perfil fundiário da região é dominado por posseiros e grileiros sem títulos de posse, alguns com extensas fazendas de gado. A grande dificuldade das autoridades ambientais era separar o proprietário legítimo, que já estava lá antes da Unidade ser criada, do grileiro de terras públicas. Não havia a possibilidade de regularizar a situação dos posseiros, mesmo aqueles que já ocupavam a terra antes de 2006, porque a área havia virado Floresta Nacional. Segundo estimativas do próprio ICMBio, existiam mais de 250 propriedades rurais dentro de Jamanxim e 110 mil cabeças de gado. Uma floresta que virou (várias) fazendas.

Gado apreendido durante Operação Boi Pirata II dentro da Flona de Jamanxim, em janeiro de 2010. Foto: Ascom Ibama.
Gado apreendido durante Operação Boi Pirata II dentro da Flona de Jamanxim, em janeiro de 2010. Foto: Ascom Ibama.

“Se tem esse número enorme de gado lá dentro, eles estão conseguindo comercializar e se a moratória tivesse tido o mesmo efeito eficaz que em outras regiões, por exemplo, na Terra do Meio, que não conseguiram comercializar, não teríamos gado nessa unidade. As medidas que deram certo em outros lugares, tipo a restrição de crédito agrícola, tem um efeito pequeno porque o financiamento não é um financiamento oficial, ele é financiado pelo garimpo. A mesma história acontece com a madeira e outras questões que movimentam ali a ocupação da área. Alguns anos a gente desbaratou uma grande quadrilha de grilagem, esperávamos que o movimento diminuísse, mas a gente continua sob pressão de grilagem de terra lá dentro”, explicou Paulo Henrique Carneiro, diretor de Criação e Manejo de Unidades de Conservação do ICMBio, numa entrevista sobre a redução de Jamanxim feita em outubro, mas ainda não publicada.

Na ocasião, ((o))eco queria entender em que patamar estava a discussão sobre a redução da Flona e como a cadeia ilegal de gado afetava a Unidade.

Pressões para a redução

Pressões externas pedem a redução da Floresta para regularizar as áreas produtivas que estão dentro da unidade desde que a mesma foi criada. De 2009, foi realizado o primeiro estudo técnico do ICMBio para rever os limites da unidade e, até agora, foram pelo menos 8 pedidos de revisão dos limites de Jamanxim.

No Senado, tramita atualmente um Projeto de Lei que anula a criação da Floresta Nacional do Jamanxim. Na Câmara, pelo menos duas propostas de decreto legislativo foram apresentados para sustar a unidade. As duas foram arquivadas.

Em agosto, o Ministério Público Federal (MPF) enviou uma recomendação ao órgão pedindo pela manutenção dos limites de Jamanxim. Os procuradores argumentavam que a redução promoverá ainda mais o avanço do desmatamento na região e não resolverá o problema de cunho fundiário, a chaga que mantém a violência na região.

“(…) 51% do desmatamento total identificado [na Amazônia] ocorreu em áreas privadas ou sob diversos estágios de posse, revelando que a ausência de proteção ambiental pelo Estado em áreas especialmente protegidas favorece às práticas de desmatamento”, afirma, no documento enviado ao órgão ambiental, a procuradora Janaina Andrade de Sousa. A recomendação do MPF lista 27 motivos para não reduzir a unidade.

Após resistir por 10 anos e tentar todo tipo de medida de comando e controle, o ICMBio preferiu ficar com uma área menor, porém administrável. A violência na região chegou ao auge com o assassinato do policial João Luiz de Maria Pereira, morto durante operação do Ibama de combate ao desmatamento e garimpo na Floresta Nacional do Jamanxim (PA), no dia 17 de junho.

Recompensas

A maior parte do território reduzido de Jamanxim (438 mil ha), foi incorporada ao Parque Nacional do Rio Novo (acima). Foto: ICMBio.
A maior parte do território reduzido de Jamanxim (438 mil ha), foi incorporada ao Parque Nacional do Rio Novo (acima). Foto: ICMBio.

Além da alteração de Jamanxim, o Governo Temer modificou os limites de mais três unidades de conservação (UCs) na Amazônia: o Parque Nacional do Rio Novo, que passou de 537.757 hectares (ha) para 976.525 ha; o Parque Nacional do Jamanxim, de 859.700 ha para 909.970 ha; e a Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós, que foi reduzida de 2.039.580 ha para 1.988.445 ha. Todas essas unidades são vizinhas de Jamanxim e estão localizadas na região da BR 163.

O acréscimo foi de mais 500 mil ha em áreas de proteção integral.

 

 

 

 

*Editado às 17h12, 16/02/2017 – Ao contrário do que afirmamos anteriormente, a Floresta Nacional de Jamanxim não sofreu  uma redução de 43% em seu tamanho, mas sim de 57%. 

 

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  • Daniele Bragança

    Repórter e editora do site ((o))eco, especializada na cobertura de legislação e política ambiental.

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Comentários 11

  1. antonio teixeira diz:

    Isso nos preocupa com relação á Resex Jaci Paraná, 205 Mil hectares com quase 100 mil cabeça de gado dentro
    Outra que esta fazendo medo e a Resex Rio Preto Jacundá além da Angelim, Estado Adormecido.


    1. George diz:

      Para conter 100 mil cabeças de gado, esses 205 mil hectares devem estar quase todos desmatados, porque boi não come árvore.

      Ou seja, a Resex já era? Ou ainda tem algum ecossistema nela que vale a pena?


      1. joao diz:

        É simples, é só ver no mapa de satélite. Não existe mais floresta na resex jaci parana, todas viraram fazenda de gado, não há motivo para o governo gastar dinheiro em dar manutenção na preservação, tem que preservar as que ainda estão de pé, infelizmente.


  2. George diz:

    "Criada em 2006 dentro de um pacote para conter o desmatamento ao longo da BR-163…"

    Criada não. Mal criada. Criada sem estudos, sem levantamentos, sem discussões públicas, sem qualquer planejamento ou recursos para sua implantação de fato. Criada por uma canetada do Lula como "solução" mágica para o assassinato da freira e a zona em que se transformara a Terra do Meio no Pará.

    O que nasce de forma inconsequente se acaba da mesma forma. Uma UC sólida nasce com estudos, apoio público, e pelo menos algum recurso para dar início a implantação. Essa não é tão fácil de desafetar depois.


    1. Ebenezer diz:

      O próprio ICMBIO nasceu de forma inconsequente …Medida Provisória, vingancinha pelos "bagres" do Madeira, "vamos dividir o Ibama", órgão com cara/nome de ONG…deu no que deu. Parabéns Marinna, Capobianko e Lulah!


  3. Sousa Santos diz:

    Eis uma boa solução para os assaltos aos bancos. É só deixar uma parte do dinheiro que iria ser roubado do lado de fora do banco e assim não seria necessário os assaltantes explodirem os bancos .
    Ótima solução feita pelo governo Temeroso.


    1. Everardo diz:

      Torço para que um dia criem uma UC na sua propriedade e que vc fique 50 anos sem indenização e sem poder realizar nenhuma atividade.


      1. Souza Santos diz:

        Pobres grileiros de terras públicas , pobres criadores de 1000, 2000 cabeças de gado.kkkkkk
        Vamos logo dizer , pobres assaltantes de banco . Hoje em dia está tão difícil assaltar um banco kkkkkk
        EITA brasizilzinho sem futuro . Completa inversão de valores.


        1. Everardo diz:

          Tá aí um exemplo do brasileiro de hoje, que não consegue interpretar mais uma simples frase. O passivo fundiário atrapalha quem tá legalizado, principalmente. Vc é mais um papagaio que não conhece a realidade. No Brasil é assim, cria a UC depois se vira. E nisso fica uma confusão eterna. Mas nessa sua visão esquerdista só existe "direito" coletivo, né? Os direitos individuais não servem pra bosta nenhuma nesse país.


          1. Sousa Santos diz:

            Kkkkkkkkkk.
            Suas duas últimas linhas já respondem tudo . Só confirmam o que eu disse.
            Kkkkkk


  4. paulo diz:

    Este vice da Dilma, mais os pmdb de sempre, fazem isto. Em vez de resolver o adultério, não, queimam o sofá. Fácil não. O raça ruim.