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Captura de macaco causa celeuma entre órgãos ambientais no Paraná

Desde o ataque a um bebê de um ano e dez meses, autoridades discordam sobre a retirada ou não do animal da área de floresta próximo ao condomínio onde ocorreu o incidente

Sabrina Rodrigues ·
20 de novembro de 2018 · 5 anos atrás
Macaco bugio não será retirado de área florestal em Araucária. Foto: Ernesto Viveiros de Castro/ICMBio.

Órgãos ambientais brigam entre si para ver quem capturará ou não um macaco bugio que atacou um bebê de um ano e dez meses dentro de um apartamento no município de Araucária, na região metropolitana de Curitiba, Paraná. O condomínio Araucária Park foi construído próximo de uma área de floresta com ocorrência da espécie e relatos informam que moradores costumavam alimentar os animais.

Na quarta-feira da semana passada, o animal entrou pela sacada do apartamento onde a criança estava e a atacou na cabeça. Era de manhã e o bebê estava na sala, sozinho, no momento do ataque. A criança foi encaminhada ao Hospital do Trabalhador, em Curitiba, onde foi submetida a uma cirurgia plástica para reconstrução de parte do couro cabeludo e recebeu sete pontos na cabeça. O bebê passa bem e está em observação, sem previsão de alta médica. Desde então, os moradores estão assustados com a possibilidade de novos ataques.

Após o incidente, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) empurram um para o outro a responsabilidade sobre as providências a serem tomadas sobre o caso. O imbróglio sobrou até para o Ibama, apontado no primeiro momento como responsável pela captura do animal, atribuição que deixou de ser do órgão após a publicação da Lei Complementar nº 140, em 2011.

Empurra-empurra

A Secretaria Municipal de Meio Ambiente da Prefeitura de Araucária já havia se articulado junto ao Batalhão da Força Verde e da Prefeitura de Curitiba a remoção do animal. Em nota no seu site, a prefeitura informou que embora não tenha atribuição legal para retirar animais de vida livre, tentou fazê-lo de forma segura e quando estavam preparados para realizar a captura do animal, o IAP não autorizou a ação.

Por sua vez, o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) informou que apenas solicitou ao órgão ambiental municipal que enviasse o pedido por escrito, como é o padrão nesses casos. Segundo nota divulgada pelo Instituto, os técnicos da Secretaria de Meio Ambiente entraram em contato por telefone no dia 19, solicitando que o IAP recebesse o animal que seria capturado pela Polícia Ambiental.

Ainda segundo a nota, o IAP não recomenda a captura do Bugio, por se tratar de gregário, que vive em bandos. “A captura do bugio teria como único destino para esse indivíduo: o cativeiro. Fato que nenhum órgão ambiental (seja municipal, estadual ou federal) deve defender, ainda mais por se tratar de espécie considerada pela Lista Vermelha Paranaense de espécies ameaçadas (Decreto Estadual 7.264 de 2010), como quase ameaçada”.

Segundo o documento, o condomínio foi construído próximo a uma área de vegetação que é habitat natural dos bugios. O órgão afirma também haver reportagens locais mostrando que os moradores do condomínio alimentavam os macacos, o que estimula o contato dos bugios com os seres humanos, algo que não é recomendado, embora se trate de um animal geralmente pacífico.

“[o ataque] não é algo comum, não é algo frequente nos macacos, especialmente nos bugios que não são animais agressivos, muito pelo contrário, são animais pacíficos, que costumam ter um hábito bastante quieto, passam bastante tempo descansando”, explica Leandro Jerusalinsky, coordenador do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros (CPB) do ICMBio.

IAP não recomenda captura

O órgão estadual ressalta que o bugio é um animal que vive em bando de normalmente 3 a 12 indivíduos, portanto, sua realocação torna-se inviável, uma vez que a retirada do bugio de seu grupo e sua transferência para outra área fará com que fique solitário ou tente espaço em um novo bando, acarretando seu óbito, em função da alta disputa por territorialidade da espécie. Somado a isso, o processo de captura — com dardos tranquilizantes — também apresenta uma alta possibilidade de danos ao animal. “Por se tratar de animal que vive em bando, a chance de outros bugios aparecerem no condomínio é grande, se as práticas de alimentação e interação dos moradores persistirem”.

Por outro lado, a SMMA afirma que segundo os levantamentos feitos pela secretaria e relatos de moradores do condomínio, há apenas um animal frequentando o local há mais de quatro meses, o que pode indicar que o bugio foi excluído de seu bando.

Possíveis soluções

Avesso à ideia de captura, o Instituto Ambiental do Paraná sugeriu três medidas que o condomínio deve tomar para evitar o aparecimento do animal: 1) A interrupção imediata de fornecimento de alimentação para esses animais; 2) Telas e proteção no entorno do condomínio e nos apartamentos e 3) Cessação de qualquer ato de contato com o animal, incluindo brincadeiras, “carinho”, etc.

Já a Secretaria Municipal de Meio Ambiente da Prefeitura de Araucária afirma que está pronta, com a ajuda da Força Verde e Prefeitura de Curitiba, para retirar o animal, que ela acredita se tratar de apenas um. Espera, para isso, a autorização do órgão estadual de meio ambiente e entrará, por enquanto, em contato com o Ministério Público, para estudar as soluções para o caso.

Para Leandro Jerusalinsky, coordenador do Centro de Primatas do ICMBio, a orientação para que esse tipo de coisa não aconteça é, em primeiro lugar, manter o habitat dos macacos, áreas de mata relativamente grandes onde os animais possam transitar, se alimentar e se reproduzir tranquilamente, sem a necessidade de entrar em contato com humanos, no caso de fragmentos mais próximos de áreas urbanas.

“[A recomendação é] nunca alimentar os animais porque isso pode alterar o comportamento deles, levando-os a ter comportamentos que não fazem parte do seu repertório natural, como um comportamento mais agressivo. A alimentação inclusive traz um problema de saúde para o animal, que passará a comer alimentos que não são da sua dieta. Um bugio se alimenta basicamente de folhas e frutos. Ao alimentá-lo, a pessoa além de gerar um problema para o animal, em médio e longo prazo, pode gerar um problema para ela mesma, já que ele irá procurar esse alimento fora da mata, invadindo a casa das pessoas”, explica Leandro.

 

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  • Sabrina Rodrigues

    Repórter especializada na cobertura diária de política ambiental. Escreveu para o site ((o)) eco de 2015 a 2020.

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Comentários 1

  1. Uacari diz:

    Acho que as autoridades devem seguir o que o Leandro Jerusalinsky disse, já que ele é o grande entendedor de macacos do Brasil, quem sabe no mundo!