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Árvores centenárias ameaçadas pela construção de metrô no Rio

Projeto de expansão da Linha 4 do metrô ameaça praça de Ipanema e tira sono de moradores que defendem projeto mais sustentável e menos caro.

Fabíola Ortiz ·
13 de dezembro de 2012 · 11 anos atrás
Debate Conversas no Museu - da esquerda para a direita - Joaquim Barbosa (SMT), Licion Rogerio (Metro que Queremos), Juliana Tinoco (debatedora), Ignez Barreto (PSI) e Chris Gaffney (pesquisador). Foto: Fabíola Ortiz.
Debate Conversas no Museu – da esquerda para a direita – Joaquim Barbosa (SMT), Licion Rogerio (Metro que Queremos), Juliana Tinoco (debatedora), Ignez Barreto (PSI) e Chris Gaffney (pesquisador). Foto: Fabíola Ortiz.

Rio de Janeiro − As obras de expansão da Linha 4 do metrô no Rio de Janeiro já estão tirando o sono de muitos moradores do bairro de Ipanema, antes mesmo da barulheira começar. O patrimônio de um dos bairros mais tradicionais do Rio de Janeiro, a Praça Nossa Senhora da Paz, e suas árvores centenárias estão em vias de descaracterização e ameaçadas pelo projeto de uma estação de metrô.

A previsão de que 47 mil usuários do metrô circulem pela praça diariamente e a iminência do corte das árvores prometem tirar a tranquilidade do bairro, alerta uma das moradoras e coordenadora do movimento Projeto Segurança Ipanema (PSI). “A Praça Nossa Senhora da Paz é um conjunto arquitetônico, histórico, ambiental e cultural importante para a cidade. Além de ser pilar de sustentabilidade do bairro, o pulmão de Ipanema, as inúmeras árvores são aliadas contra a poluição e mantém a temperatura do bairro que seria mais quente sem aquele arvoredo. As obras do metrô vão descaracterizar o bairro”, alerta a ((o)) Eco Ignez Barreto do PSI.

A expansão da Linha 4 do metrô no Rio de Janeiro prevista para entrar em operação em 2016, a fim de absorver a demanda por transporte com a realização das Olimpíadas, foi tema de um acalorado debate, nesta terça-feira, dia 11 de dezembro, no ciclo “Conversas no Museu” do Meio Ambiente, no Jardim Botânico.

A discussão sobre mobilidade e qual o tipo de transporte que o Rio precisa atraiu pesquisadores, engenheiros, representante do poder público e movimentos sociais que reivindicam melhores opções de transporte público para a cidade.

Segundo informações da  concessionária Rio Barra, a Linha 4 do metrô ligará a Barra da Tijuca, na zona oeste da cidade, à Ipanema, na zona sul, e deverá transportar mais de 300 mil pessoas por dia. Os estudos feitos pela concessionária garantem ser possível retirar das ruas cerca de 2 mil veículos por hora e, assim, desafogar o trânsito.

Seis novas estações

A linha 4 que, na prática, é uma extensão da já existente linha 1 terá seis novas estações e 16 quilômetros de extensão ligando o Jardim Oceânico, na Barra da Tijuca, à estação General Osório, em Ipanema, passando por  São Conrado, Gávea, Praça Antero de Quental, Jardim de Alah e Praça Nossa Senhora da Paz. A viagem levará pouco mais de 15 minutos, estima a concessionária. A previsão é que a inauguração da  linha ocorra em dezembro de 2015.

A promessa é reduzir o tempo de viagem no trajeto da Barra da Tijuca ao centro que poderá levar 34 minutos do Jardim Oceânico à estação Carioca, no ponto nervoso da cidade.

Falta de diálogo

O movimento PSI existe há 5 anos liderado por Ignez Barreto que encabeçou recentemente uma ação na justiça para emperrar a construção da primeira estação, justamente na Praça Nossa Senhora da Paz. A justificativa é a falta de diálogo, critica a coordenadora.

Ignez Barreto, coordenadora do movimento Projeto Segurança Ipanema. Foto: Fabíola Ortiz
Ignez Barreto, coordenadora do movimento Projeto Segurança Ipanema. Foto: Fabíola Ortiz

O projeto, resume Barreto, prevê que estação seja construída no subsolo da praça a 22 metros de profundidade. “Vão cortar a praça na sua diagonal e abrir uma grande cratera, retirando as árvores centenárias. A gente propõe uma tecnologia nova chamada arco celular que, através de um pequeno buraco de acesso, se constrói a estação sem que a obra chegue à superfície e, assim, mantém o patrimônio da praça”.

Barreto denuncia o risco de o bairro ser descaracterizado com a construção da estação no projeto atual. “A gente propõe apenas que a obra seja feita levando em conta a preservação ambiental, social e histórica. Não somos contra a expansão do metrô e nem queremos atrasar a obra. Só estamos propondo que a obra seja feita com outra tecnologia e que os acessos não sejam no entorno imediato da praça. Só queremos preservar o nosso bairro”, acrescentou.

Apesar esta ser uma tecnologia mais cara, retiraria o custo da compensação ambiental pelo impacto da obra da linha que é de R$ 1,5 bilhão. Barreto reclama ainda da falta de diálogo com as autoridades que fez com que o movimento entrasse com uma ação na justiça para embargar a obra.

Barreto garante que o apoio dos moradores é grande. Recentemente cerca de 30 mil assinaturas foram recolhidas questionando o atual projeto.
“Não houve audiência pública para discutir o tema. Existe maneira de fazer de outra forma, mas o governo está irredutível”, destacou.

Os moradores propõem ainda que quatro acessos à estação sejam construídos nas calçadas próximas ao movimento do comércio e não na entrada da praça, como está no planejamento. A justificativa é reduzir o fluxo de milhares de pessoas na praça, pois muitas crianças e idosos aproveitam o lugar para lazer.

Método caro e ultrapassado

O geólogo Newton Carvalho, membro do Fórum de Mobilidade Urbana, estudioso dos subterrâneos do Rio de Janeiro há 20 anos, garante que o método de construção utilizado além de ultrapassado é “uma barbaridade em termos geológicos”.

Segundo Carvalho, o subsolo de Ipanema e Leblon não comportam a magnitude desta obra, pois é formado por sedimentos. “O método atual empregado é ultrapassado, se chama vulgarmente de ‘vala aberta’. Uma técnica ultrapassada com maior impacto social, pois fecha grandes espaços e abre-se uma grande vala”.

O alto custo ainda é um fator alarmante: R$ 8,5 bilhões para seis estações. É maior que o projeto de transposição do Rio São Francisco que já alcançou um custo de R$ 8,2 bilhões, sendo a maior obra de infraestrutura hídrica em andamento no país.

“Sou contrário ao projeto que constroi as estações do metrô no subsolo de Ipanema e Leblon, formado por sedimentos. Defendo que a construção seja pela rocha, acompanhando a cadeia montanhosa”, explicou a ((o)) Eco.

Projeto alternativo

Newton Carvalho desenvolveu um projeto alternativo à Linha 4 como fruto de sua pesquisa de mestrado e doutorado, 1998 e 2006, respectivamente, chamado de “Alternativa W”.

“A alternativa é a extensão da Linha 4 pela Barra da Tijuca até Realengo, seguindo a rocha nas montanhas. Eu proponho no meu projeto a escavação pela rocha, seguindo a linha do cordão montanhoso e não pelo subsolo de Ipanema e Leblon que é inadequado”, explicou.

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A Alternativa W, explicou Carvalho, foi concebida para seguir a estrutura do maciço rochoso, alcançar quase 50 bairros distribuídos no centro, zona sul e oeste da cidade.

O projeto mapeia a construção de 39 estações e, apenas numa estimativa inicial para 18 estações de metrô que incluiriam o trecho do centro da cidade até à Gávea, da Barra da Tijuca até Jacarepaguá e Jacarepaguá até Realengo, o custo totalizaria R$ 5,6 bilhões para cerca de 30 quilômetros de túneis.

Bem inferior aos R$ 8,5 bilhões para 16 quilômetros divulgado pela concessionária Rio Barra para as seis estações de Ipanema até o início da Barra da Tijuca.

“Essa obra certamente contribuirá com a melhoria da qualidade de vida e a preservação da beleza natural em superfície, reduzindo consideravelmente o trânsito de veículos nas ruas, melhorando a qualidade do ar, diminuindo o tempo de percurso de casa para o trabalho/escola, entre outros”, afirma Newton em seu projeto.

Plano sustentável de obras
Em recente comunicado divulgado, a concessionária garante que a Praça Nossa Senhora da Paz está incluída no plano de sustentabilidade das obras. “O projeto da Linha 4 do metrô é 100% sustentável, já que quase a totalidade da árvores será preservada e as que precisarem ser removidas serão levadas para um horto e reconduzidas ao mesmo ponto ao fim da obra”.

A empresa afirma ainda que serão plantadas novas mudas para substituir espécimes que não permitem replantio.

“Além disso, a zona sul ganhará outras 400 mudas como forma de compensação ambiental. O metrô é o meio de transporte de massa mais ambientalmente correto porque retira veículos da rua, reduzindo a emissão de gás carbônico no ar”.

Em estudo da Fundação Getúlio Vargas encomendado pela empresa, o número de viagens de automóveis na região atendida pela Linha 4 seria reduzido em 40%. Estes usuários representariam 28% da demanda total da Linha 4. Para os ônibus a redução seria de cerca de 48%, contribuindo com 72% da demanda total desta linha.

“Todo o projeto foi minuciosamente estudado por mais de 200 técnicos e as obras seguem os mais rígidos padrões de segurança internacional. As obras estão sendo executadas por meio de técnicas modernas – utilizadas em empreendimentos metroviários de referência em todo o mundo, como Nova York, Londres, Budapeste, Boston e Paris. Uma dessas técnicas é a do Tunnel Boring Machine (TBM), o “Tatuzão” – equipamento que vai perfurar os túneis na Zona Sul sem a necessidade de explosões”, se defende a empresa em seu website.


  • Fabíola Ortiz

    Jornalista e historiadora. Nascida no Rio, cobre temas de desenvolvimento sustentável. Radicada na Alemanha.

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