“São raros os animais desta época. E este é o primeiro carnívoro desta época encontrado no Brasil”, comemora o paleontólogo Juan Carlos Cisneros, do Centro de Ciências da Natureza da Universidade Federal do Piauí, responsável pela descoberta. O achado foi publicado na revista da Academia de Ciências dos Estados Unidos, Proceedings of the Nacional Academy of Sciences (PNAS).
Apesar da aparência, ele não é classificado como um dinossauro, mas como um terapsidio, que já possuíam características encontradas em mamíferos. Os dinocefalios foram extintos e não deixaram descendentes. Os mamíferos atuais são descendentes dos serafideos.
De acordo com Cisneros, o P. biccai possuía características de répteis atuais, como rugosidades que recobriam os ossos do crânio, semelhantes as dos jacarés. Mas esses predadores mantinham também semelhanças com mamíferos. “Ele tinha a postura mais erguida e não rastejava. Possuía presas – dentes diferentes na boca -, pois répteis têm dentes iguais”, explica Cisneros.
Análises das afinidades da nova espécie sugerem que ela é parente de dinocefalios carnívoros encontrados na Rússia e África do Sul, o que muda a compreensão sobre a distribuição da fauna do supercontinente Pangeia, grande extensão de terras que deu origem aos continentes atuais.
A presença de um dinocefalio onde hoje são terras brasileiras é uma forte evidência de que vertebrados terrestres como o Pampaphoneus e seus parentes eram capazes de se deslocar por grandes distâncias, por exemplo, entre o que hoje é a Rússia, África do Sul e Brasil.
Deslocamentos como esse indicam que a fauna da Pangeia teve uma distribuição global antes do que se imaginava, já no período Permiano Médio (entre 299 milhões e 251 milhões de anos atrás). A hipótese mais aceita era de que a distribuição destes animais pelo supercontinente havia ocorrido no período seguinte, o Triássico (entre 251 milhões e 199 milhões anos atrás), já no Mesozoico.
Ele é o primeiro carnívoro da Era Paleozóica encontrado na América do sul. Na região, já haviam sido encontrados herbívoros que viveram no mesmo período, como pareiassauros e o anomodonte Tiarajudens eccentricus.
O nome dado gênero Pampaphoneus, ou matador dos Pampas, é uma referência à região onde foi encontrado. Enquanto que biccai é uma homenagem ao dono da fazenda onde o fóssil foi achado, José Bicca. Uma curiosidade é que O sítio paleontológico foi identificado a partir de imagens do Google Earth.
Durante dois anos, Cisneros e outros pesquisadores percorreram a região. Lá, encontraram dentes de tubarões de água doce, que viveram na mesma época do P. biccai. “Neste momento, vimos que havia fósseis ali”, conta o pesquisador.
Eles continuaram a visitar a área durante dois anos. Até que, em abril de 2008, foi encontrado um crânio com 38 centímetros de comprimento. Mas a confirmação da descoberta só veio depois dos ossos serem limpos, analisados e comparados com o de outros fósseis da África do Sul e Rússia.
Artigo “Carnivorous dinocephalian from the Middle Permian of Brazil and tetrapod dispersal in Pangaea. Proceedings of the National Academy of Sciences (no prelo)”
Autores:
Fernando Abdala. University of the Witwatersrand, África do Sul.
Saniye Atayman-Güven. University of the Witwatersrand, África do Sul.
Bruce S. Rubidge. University of the Witwatersrand, África do Sul.
A. M. Celâl Sengör. İstanbul Teknik Üniversitesi, Turquia.
Cesar L. Schultz. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil.
Leia também
A nova distribuição da vida marinha no Atlântico ocidental
Estudo de porte inédito pode melhorar políticas e ações para conservar a biodiversidade, inclusive na foz do Rio Amazonas →
Uma COP 30 mais indígena para adiarmos o fim do mundo
Sediada pela primeira vez na Amazônia, a conferência traz a chance de darmos uma guinada positiva no esforço para frear a crise climática que ameaça nossa espécie →
PSOL pede inconstitucionalidade de lei que fragiliza o licenciamento ambiental no ES
Para o partido, as mudanças no licenciamento estadual não estão previstas na legislação federal e prejudicam o meio ambiente; lei tirou espaço da sociedade civil nos processos →