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Finalmente

Com a posse de Antonio Benjamin, a mais alta corte do país em matéria infraconstitucional passa a ter um especialista em Direito Ambiental Uma média de 2 casos por mês o espera.

24 de agosto de 2006 · 18 anos atrás

Começa, na primeira semana de setembro — mais precisamente no dia 6, véspera do feriado da independência –, o mais promissor período para o direito ambiental no Superior Tribunal de Justiça. É que nesse dia toma posse como Ministro o Procurador Antonio Herman de Vasconcellos Benjamin, indicado por Lula para a vaga de Edson Vidigal e de longe o maior especialista em direito ambiental a já assumir um dos 33 assentos daquela corte.

No lugar certo

Segundo a página do STJ, “ele vai integrar a Segunda Turma e a Primeira Seção do STJ, órgãos responsáveis pelos julgamentos de questões referentes ao Direito Público, entre elas, os recursos sobre Direito Ambiental”.

Seu currículo na área é invejável. Formado em Direito pela Universidade do Rio de Janeiro em 1980, com mestrado pela University of Illinois College of Law; membro do Ministério Público Paulista e coordenador do CAO das Promotorias de Justiça do Consumidor; eleito, em 2005, co-presidente da Internacional Network on Environmental Compliance and Enforcemente (Inece) – a Rede Mundial de Órgãos e Entidades de Implementação Ambiental; membro do Conselho Diretor da Comissão Fulbright desde 2001 e do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama); há 12 anos professor de Direito Ambiental e Comparado e Direito da Biodiversidade na Universidade do Texas; autor e organizador de diversos livros sobre o tema, além de organizador da Revista de Direito Ambiental.

Em resumo, e que me perdoem os demais Ministros, finalmente temos alguém na mais alta corte infraconstitucional do país capaz de decidir, com conhecimento de causa, acerca de questões efetivamente técnicas de direito ambiental. É a luz no fim do túnel para quem está cansado de ver desenvolvimento sempre pesar mais do que preservação ambiental na balança do Judiciário. Pelo menos nas poucas causas envolvendo questões ambientais que chegam ao STJ. Pouquíssimas, diga-se de passagem.

Desde a sua criação, com a Constituição de 1988, o STJ só julgou 205 causas e recursos direta ou indiretamente relacionados ao meio ambiente — de um total de cerca de 210 mil. Dá uma média de aproximadamente 11,4 causas por ano. Mas a coisa não é assim tão ruim a ponto de entediar o novo Ministro. A média não é homogeneamente distribuída nesse período. Antes de 1998, quando foi promulgada a Lei 9.605, que trata dos crimes ambientais, o número de processos dificilmente ultrapassava 6 por ano. A média era de menos de 4. De 1998 para cá, no entanto, houve um crescimento exponencial nessa estatística. Em 1998 foram 7 processos; em 1999, 6; em 2000, 14; em 2001, 16; 28 em 2002; 27 em 2003; 34 em 2004; e 24 em 2005. Este ano, até agora, foram 23 casos julgados.

Poucas e boas

Ou seja, Antonio Herman assume com a perspectiva de analisar, em média, cerca de 2 casos por mês envolvendo questões ambientais. Parece um tremendo desperdício de um tremendo ministro, mas não é. O número baixo de causas ambientais no STJ, acredito, tem três razões de ser.

A primeira delas — e mais óbvia — é o pequeno número de causas sobre matéria ambiental ajuizadas no país o que, por sua vez, é um problema relacionado com a questão da impossibilidade de se ganhar dinheiro com a vitória em ações civis públicas, o instrumento mais utilizado no país na defesa judicial do meio ambiente. Como a própria lei que regula a matéria determina que quaisquer valores de condenações nesse tipo de demanda não vão para a parte vitoriosa, mas para fundos públicos ambientais, quase ninguém se dispõe a contratar advogado para comprar esse tipo de briga. Pra quê gastar dinheiro se não se vai receber nada no fim da briga? Sobra, então, para o Ministério Público o papel de guardião do meio ambiente, dependendo de denúncias dos ecologistas de plantão que se dispõem a ter o trabalho de fazê-las. E o MP, como seria de se esperar, não dá conta do recado.

A segunda razão para a falta de causas ambientais nos tribunais superiores é até boa. Penso que seja um sinal de que boa parte das ações ajuizadas acaba antes de chegar nessa instância, em Termos de Ajustamento de Conduta. Eis um valiosíssimo instrumento que o Ministério Público utiliza muito e bem, para acabar, cedo, com ações ambientais. Nesses casos, todo mundo sai ganhando.

Por último, acredito que, pela complicação e gasto extras que envolve litigar nas instâncias superiores, somente as causas de maior relevância chegam a esse ponto. Se a briga não for muito importante, as pessoas às vezes preferem não se dar ao trabalho. É bem verdade que existe muita causa mixuruca de Juizado Especial que acaba no STF, mas há um bom processo de filtragem antes de os assuntos serem remetidos a Brasília.

É justamente aí que se justifica ter alguém como Antonio Herman no STJ. Alguém com a sua qualidade e conhecimento de causa brilha justamente em causas relevantes, com problemática intrincada e implicações sérias. Desperdício seria colocá-lo para julgar briga de vizinho por conta de papagaio clandestino ou galho de abacateiro que passa por cima do muro e acaba cortado. Onde está, o novo Ministro está muito bem colocado, e tem a chance de fazer um belo trabalho na criação da jurisprudência ambiental brasileira.

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