Colunas

Direito à riqueza e ao meio ambiente

Desenvolvimento e preservação não podem ser excludentes. A proteção ao meio ambiente no Brasil vai melhorar na proporção em que melhorar o nível de renda.

13 de setembro de 2004 · 20 anos atrás
  • Paulo Bessa

    Professor Adjunto de Direito Ambiental da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)

As imensas polêmicas que vêm grassando na sociedade brasileira sobre desenvolvimento e proteção ao meio ambiente estão cada vez mais acirradas e, de certa forma, refletem um diálogo de surdos e a pouca disposição para que as partes possam, reciprocamente, ouvir os argumentos umas das outras.

Como se sabe, o desenvolvimento econômico no Brasil sempre se fez às custas do meio ambiente, pois calcado na exportação de produtos primários, extraídos sem qualquer preocupação com a sua sustentabilidade. Mesmo após o início da industrialização tal tendência se manteve. Atualmente, começa a se formar uma nova orientação que considera o fator ambiental como relevante. Esta mudança de concepção, contudo, não é linear e se materializa em contradições e dificuldades na implementação de políticas industriais que levem em conta o ambiente. A questão chave a ser enfrentada é saber em que medida é possível a conciliação entre o desenvolvimento econômico e a proteção do meio ambiente, e mais: até que ponto prevalece o interesse da proteção ambiental ou o interesse do desenvolvimento econômico? Evidentemente, também se faz necessária a conjugação de tais elementos com o chamado social, visto que as populações mais pobres são aquelas que sofrem mais com as mazelas ambientais, como nos caso de Bhopal, Cubatão e outros.

A Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981 (Política Nacional do Meio Ambiente), em seu artigo 2°, determina: “A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições de desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana…”

O fato é que a proteção ao meio ambiente brasileiro estará fadada ao insucesso se não houver um acréscimo nos níveis de renda da população brasileira e uma melhoria substancial na sua distribuição. Qualquer análise que se faça do estado do meio ambiente no Brasil – e nisto nada temos de diferente dos demais países do mundo – demonstrará que os principais problemas ambientais se encontram nas áreas mais pobres e que as maiores vítimas do descontrole ambiental são os chamados setores vulneráveis da sociedade. De fato, há uma relação perversa entre condições ambientais e pobreza. Assim, parece óbvio que as condições ambientais somente poderão ser melhoradas com uma mais adequada distribuição de renda entre membros de nossa sociedade. A propósito, o Brasil é signatário da Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento que, no § 1º do artigo 1º, dispõe: “O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável, em virtude do qual toda pessoa e todos os povos estão habilitados a participar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, a ele contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados”.

Tal disposição deve ser interpretada conjuntamente com o § 1º do artigo 2º, que define: “A pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento e deveria ser participante ativo e beneficiário do direito ao desenvolvimento”. Há ainda que considerar que o conceito de desenvolvimento tem alguns elementos-chaves, como por exemplo: “Os Estados devem tomar, em nível nacional, todas as medidas necessárias para a realização do direito ao desenvolvimento e devem assegurar, inter alia, igualdade de oportunidade para todos, no acesso aos recursos básicos, educação, serviços de saúde, alimentação, habitação, emprego e distribuição eqüitativa da renda. Medidas efetivas devem ser tomadas para assegurar que as mulheres tenham um papel ativo no processo de desenvolvimento. Reformas econômicas e sociais apropriadas”.

A Declaração prossegue afirmando em seu artigo 9º que: “Todos os aspectos dos direito ao desenvolvimento estabelecidos na presente Declaração são indivisíveis e interdependentes, e cada um deles deve ser considerado no contexto do todo”.

É indiscutível, portanto, que o direito ao desenvolvimento é um dos mais importantes dos direitos humanos e que ele não é contraditório com o direito ao meio ambiente saudável. Muito ao contrário, são direitos complementares e indissociáveis. Logo, as atuais querelas são despropositas e revelam um desconhecimento profundo dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil na arena internacional.

Leia também

Colunas
17 de abril de 2024

Declaração de Barcelona define novos rumos para a Década do Oceano

O encerramento do evento oficializou a primeira conferência da Década do Oceano de Cidades Costeiras que ocorrerá em 2025 na cidade de Qingdao, na China.

Salada Verde
17 de abril de 2024

Marina Silva é uma das 100 pessoas mais influentes de 2024, segundo a Time

Selecionada na categoria “líderes”, perfil de Marina destaca a missão da ministra em prol do combate ao desmatamento ilegal na Amazônia. Ela é a única brasileira citada na lista de 2024

Reportagens
17 de abril de 2024

Em audiência pública na ALMG, representantes da UFMG alertam para impactos da Stock Car

Reunião contou com reitora e diretores da universidade, mas prefeitura e organizadores da corrida faltaram; deputada promete enviar informações a patrocinadores da Stock Car

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.