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Nova lei de terras do Pará abre caminho para a grilagem, diz MPF

Órgão destaca inconstitucionalidades do Projeto de Lei nº 129/2019, aprovado pela Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) como violações ao processo legislativo e garantias constitucionais

Sabrina Rodrigues ·
27 de junho de 2019 · 5 anos atrás
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Sua porção fresquinha de informações sobre o meio ambiente
Área desmatada no município de Novo Progresso (PA). Foto: Marcio Isensee e Sá.

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão que integra o Ministério Público Federal (MPF), enviou uma Nota Técnica ao governador do Pará, Helder Barbalho, apontando inconstitucionalidades no Projeto de Lei 129/2019, que trata de novas regras para a regularização fundiária do estado. A norma foi aprovada  no dia 11 de junho pela Assembleia Legislativa do Pará (Alepa). A proposta aguarda a sanção ou o veto do governador.

Com o argumento de “agilizar” e “desburocratizar” o processo de concessão de terras públicas no Pará, o PL está sendo criticado por abrir as portas para a legalização de terras obtidas através de grilagem. 

Nas dez páginas do documento, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão traçou algumas irregularidades da norma. Primeiro questionou a rapidez com que o processo foi tratado, levando apenas 33 dias de tramitação na Alepa. O texto foi aprovado em dois turnos em um único dia, contrariando o regimento interno da Assembleia que determina que os projetos de lei devem ter dois turnos de discussão e votação, com observância de intervalos entre os períodos. De acordo com o regimento, mesmo para projetos de lei com tramitação de urgência é vedada a votação da matéria em dois turnos no mesmo dia.

“De fato, causa espanto que, exatamente no Estado campeão em conflitos no campo, segundo dados históricos levantados pela Comissão Pastoral da Terra, e com um cenário de “grilagem” de terras que permanece inalterado ao longo do tempo, se pretenda decidir questões tão complexas em tempo tão diminuto e com baixo conhecimento dos impactos na vida coletiva”, critica o órgão.

O Ministério Público Federal critica também a ausência da realização de uma audiência pública para discutir o assunto. 

O segundo destaque é em relação ao preço das terras que poderão ser vendidas à iniciativa privada por valor irrisório, com preço até nove vezes inferior ao do mercado de terras. 

A Procuradoria relata em todo o documento que a Constituição Federal deve ser respeitada, e que é preciso assegurar que a destinação de terras públicas e devolutas não se faça em prejuízo da população do campo que aguarda a implementação do direito à moradia. 

“No entanto, o PL 129/2019 aparentemente não ostenta compromisso maior quanto ao cumprimento de quaisquer dessas metas. Isso porque, como apontado pela nota técnica do Imazon, ‘facilita a legalização de terras públicas ocupadas ilegalmente para especulação e com dispensa do cumprimento constitucional da função social da terra’; permite a venda de médios e grandes imóveis com dispensa de licitação; estimula a “grilagem”, pois a regularização se dá com preços irrisórios, até nove vezes inferior ao valor de mercado”.

E o MPF continua: “Há, ao menos potencialmente, a satisfação de interesses particulares em prejuízo à população mais necessitada, com possibilidade de grave e irreversível impacto na estrutura fundiária do Pará, seja no que diz respeito à “grilagem”, seja quanto ao aumento da violência no campo, já em si absurda”.

Os procuradores que assinam a nota técnica finalizam o documento destacando a necessidade do PL 129/2019 voltar para a Assembleia Legislativa para nova proposta. 

 

Saiba Mais 

Nota Técnica nº 11/2019

 

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  • Sabrina Rodrigues

    Repórter especializada na cobertura diária de política ambiental. Escreveu para o site ((o)) eco de 2015 a 2020.

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