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Convivendo com a onça-pintada

Guias de convivência entre seres-humanos e o grande felino esclarecem nosso impacto sobre ele e dele sobre nós. É um caminho para a preservação da espécie ameaçada.

15 de setembro de 2009 · 15 anos atrás
  • Peter G. Crawshaw Jr.

    Formado em Ciências Biológicas em 1977 pela Unisinos, RS, com mestrado e doutorado pela Universidade da Florida. Trabalhou no...

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O primeiro impulso para a mudança é a informação. Esta não é uma frase vazia. Sempre que se pretender modificar uma realidade, o primeiro passo deve ser informar aqueles que têm influência sobre ela.

Para a realidade da onça-pintada, não é diferente.

Nesse direcionamento, o Projeto Conviver Gente e Onças está lançando a coleção Guias de Convivência, de Silvio Marchini e Ricardo Luciano (2009 – Projeto Conviver Gente e Onças, Fundação Ecológica Cristalino e Wildlife Conservation Research Unit). Aliás, o Guia de Convivência Gente e Onças já está na 2ª Edição e oferece uma visão geral sobre as onças-pintadas e suas relações com os seres humanos.

O Guia aborda a biologia e a ecologia das onças-pintadas. Fala do impacto que elas têm sobre a pecuária e sobre a população rural por meio da predação de animais domésticos, de nosso impacto sobre elas por meio do desmatamento e da perseguição, relacionando ainda as razões – ecológicas, econômicas, legais, culturais, emocionais e éticas – que devem nos motivar a conviver com as onças. Também traz as medidas que devemos tomar para resolver os problemas que elas podem causar, para protegê-las e, desse modo, poder conviver com elas. Além disso, o livro dá dicas de como encontrar mais informações sobre onças em livros, revistas e na internet. Explica onde vê-las em zoológicos e observá-las na natureza. Para quem quer ir um pouco além, o Guia ensina como fotografá-las, ouvi-las, e encontrar, identificar e registrar suas pegadas. Na segunda edição, o livro traz um conteúdo adicional sobre onças-pardas (também chamadas de pumas ou suçuaranas) e fotos de Steve Winter, da Revista National Geographic, além de tratar em maior detalhe o tema do risco de ataques de onças sobre seres humanos, sobretudo o risco decorrente de práticas inadequadas de ecoturismo.

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Cada parte traz ilustrações simples e atraentes, que transmitem de forma direta o conceito abordado, tornando divertida a apreensão do conteúdo, mesmo para a população rural que tenha menos instrução ou para o jovem estudante que deseje aprender um pouco mais a respeito da onça.

A versão em espanhol, traduzida pelo veterinário venezuelano Rafael Hoogesteijn, chama-se Guía de Convivencia Gente y Jaguares e tem o apoio da Fundação Panthera para distribuição nos países da América Latina

Também foram lançados livros de atividades: “Onças: O Que São e Como Vivem” e “Gente e Onças: Conflito e Convivência”. Esses livros buscam levar a informação por meio de interatividade e propostas que interessem aos pré-adolescentes. Os livros de atividades vêm sendo testados com estudantes de 5ª a 8ª séries de duas escolas públicas rurais de Alta Floresta, no norte do Mato Grosso, por meio do projeto Escola da Amazônia.

Desde os primeiros estudos da espécie, no final da década de 70, ficou clara a dependência do sucesso na conservação da onça-pintada na opinião e atitude das pessoas que convivem com elas no seu cotidiano. O conflito criado, principalmente pela noção errônea que as pessoas têm da espécie, no sentido da ameaça que esses felinos podem representar, acaba levando a uma atitude de controle preventivo, eliminando-os sempre que detectados. No entanto, as estatísticas atestam claramente a raridade de ataques não-provocados a pessoas, por onças-pintadas. O guia nos mostra esse fato, comparando a mortalidade do ser humano provocada por outros animais, incluindo desde mosquitos e abelhas a cães domésticos. Por outro lado, no outro componente importante do conflito, causado pela depredação ocasional que as onças promovem na pecuária, o guia oferece informações fundamentais para a compreensão e mesmo redução efetiva do problema, através de medidas de baixo custo no manejo preventivo do gado. Os autores nos mostram de maneira simples a complexidade dos fatores envolvidos no problema, interligando a competição que o Homem move indiretamente contra as onças, caçando as espécies nativas que são o seu alimento natural (capivaras, veados e porcos-do-mato), diminuindo a densidade delas nas florestas, que por sua vez, vem sendo derrubadas para dar lugar aos pastos. Ao mesmo tempo, introduzem o gado, muitas vezes a curta distância ou ocupando os mesmos habitats ou ambientes ocupados pelas onças. Como predador oportunista que é, a onça, nesses casos, se vê obrigada a predar bezerros, vacas e outros animais domésticos, quando lhe faltam suas presas habituais. Nesse contexto, o guia enfatiza que, mesmo que tomadas todas as medidas possíveis e cabíveis, é possível que o problema não seja totalmente eliminado, ainda que possa ser drasticamente reduzido. Nesse caso, é extremamente importante a relação dos motivos citados, que nos levam a relevar os prejuízos causados por uns poucos indivíduos. Esses motivos são de ordem legal, moral, ética e mesmo econômicos, onde a presença das onças pode significar um aumento na afluência turística, em algumas regiões. Como dito pelos autores, o Guia, ao invés de enfatizar o conflito, enfatiza a convivência.

Tenho certeza de que o Guia irá atingir as pessoas certas, nos lugares do Brasil onde ainda é possível buscar a boa vontade em conviver com uma espécie tão importante da nossa fauna, preservando indefinidamente essas populações para o futuro. Até porque a extinção é um ponto do qual não há retorno, como já ocorre com a onça-pintada na maior parte do sul do país.

Os livros da Coleção Guias de Convivência podem ser baixados gratuitamente das seguintes páginas: 

 

www.escoladaamazonia.org/projetogenteeoncas/
www.amazonarium.com.br/onca/
www.icmbio.gov.br/cenap/

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* com Priscila Cavalcanti

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