Manaus, AM – Esses dois gatos-do-mato são tão parecidos que durante séculos foram considerados populações diferentes de uma única espécie. Só agora, graças a análises genéticas, foi possível confirmar a distinção entre o Leopardus trigrinus, que vive mais ao norte, do Leopardus guttulus, encontrado principalmente em estados do Sul e Sudeste do país. Os estudos que distinguem esses dois felinos foram publicados esta semana na revista científica Current Biology, por pesquisadores brasileiros.
Com peso médio de 2,4 quilos, eles são um pouco maiores do que um gato doméstico. Ambos têm coloração amarelada, com manchas escuras. Mas existem diferenças sutis entre eles. “As manchas, ou rosetas, têm forma e tamanho levemente diferenciados e a cor do fundo também é diferenciada”, afirma o biólogo Tadeu Gomes de Oliveira, coordenador do projeto Gato-do-Mato.
A equipe analisou amostras de gatos-do-mato desde o Rio Grande do Sul até o Maranhão e descobriram que as diferenças entre as populações encontradas ao norte e ao sul do país são tão grandes que determinam a existência de duas espécies. Descobriram também que, embora existam híbridos com outras espécies de gatos-do-mato, essas duas espécies tão semelhantes não produzem descendentes férteis.
“Todos os gatos-do-mato do norte eram geneticamente diferentes das populações do Sul e Sudeste, com um detalhe, todos os indivíduos do norte tinham mistura com o DNA de outra espécie de gato-do-mato, o gato-palheiro (Leopardus colocolo)”, conta Tadeu de Oliveira. No sul, também ocorre essa miscelânea genética, mas com outra espécie, explica. No Rio Grande do Sul, havia a mistura com o Leopardus geoffroyi, conhecido como gato-do-mato-grande.
Em 38% dos gatos-do-mato do sul encontrou-se material genético do L. geoffroyi. Tadeu de Oliveira destaca que as duas espécies foram encontradas dividindo a mesma área apenas em Goiás, mas não havia híbridos entre eles. Tadeu de Oliveira destaca uma curiosidade: “Eles se misturam com espécies que sempre foram reconhecidas como distintas, mas não entre eles, que eram considerados a mesma espécie”.
As duas espécies de gatos-do-mato preferem habitats distintos, embora isso seja resultado das características das regiões onde ocorrem. Enquanto o tigrinus é encontrado principalmente em ambientes naturais mais abertos do cerrado e da caatinga, o guttulus está mais associado às remanescentes de florestas. Um dos ganhos de descobrir que se tratam de espécies distintas é poder refletir melhor sobre a estratégia de protegê-los.
Outra consequência: saber que são duas espécies distintas revela que ambas estão mais susceptíveis a desaparecer do que quando se imaginava serem o mesmo animal. O Leopardus trigrinus é classificado com vulnerável na Lista Vermelha da IUCN. Na natureza, é um animal encontrado em baixas densidades, cerca de 0,24 indivíduos por km². Para fazer uma comparação, a densidade de jaguatiricas é de um indivíduo por km², em ambientes naturais.
Saiba Mais
Artigo: Current Biology, Trigo et al.: “Molecular data reveal complex hybridization and a cryptic species of Neotropical wild cat.” (Dados moleculares revelam complexa hibridização e uma espécie oculta de gato-do-mato)
Leia Também
Um gato do mato com pedigree real
Por que conservar carnívoros?
Pequenos notáveis: base da pirâmide alimentar
Leia também
Eletrobras contraria plano energético e retoma projetos para erguer megausinas no Tapajós
Há oito anos, as usinas do Tapajós estão fora do Plano Decenal de Energia, devido à sua inviabilidade ambiental. Efeitos danosos são inquestionáveis, diz especialista →
Obra para desafogar trânsito em Belém na COP30 vai rasgar parque municipal
Com 44 hectares, o Parque Ecológico Gunnar Vingren será cortado ao meio para obras de mobilidade. Poderes estadual e municipal não entram em acordo sobre projeto →
Governo do RJ recebe documento com recomendações para enfrentamento ao lixo no mar
Redigido pela Rede Oceano Limpo, o documento foi entregue durante cerimônia no RJ. O plano contém diretrizes para prevenir, monitorar e conter o despejo de lixo nos oceanos. →