Análises

Porque não podemos proibir a caça do javali no Brasil

A caça de controle é recomendada em todos os países afetados pelo problema, e não capricho de pesquisadores, caçadores e gestores ambientais tupiniquins

Felipe Pedrosa · Marcelo Osório Wallau ·
27 de janeiro de 2019 · 5 anos atrás
Javali flagrado por armadilha fotográfica entre o Parque Nacional do Itatiaia e a Reserva Particular do Patrimônio Natural Alto Montana, em Itamonte/MG. Foto: Projeto Javali na Mantiqueira – Instituto Alto Montana.

A única espécie animal cuja caça é permitida por lei hoje no Brasil é a do javali. Ainda assim, sob a premissa de controle populacional. Com exceção de caça de subsistência e científica, demais modalidades de caça estão suspensas ou proibidas no país. Aquele que for pego caçando outra coisa que não o javali deve prestar contas à justiça pelos seus atos e não virar bode-expiatório para a proibição à caça do javali.

Relatos da invasão de javalis no Brasil remontam a década de 1980. Mas foram nos últimos dez anos que eles mostraram realmente que chegaram pra ficar: uma espécie com potencial invasor sem precedentes, ameaçando a biodiversidade brasileira por competir por recurso e espaço com as espécies nativas e por promover alterações físicas profundas nos habitats, além de serem destruidores da agricultura e pecuária, hospedeiros e vetores de zoonoses e de doenças de importância econômica, o que só agrava sua insustentabilidade socioambiental quando fora de controle.

A declaração da nocividade dos javalis (IN 03/2013 do IBAMA) era evidente e nem precisaria ter esperado chegar à situação que chegou o Brasil hoje para fazê-lo – são mais de 1500 municípios afetados em todas as regiões do país. Uma vez sob esse status, seu controle deveria estar imediatamente autorizado como previsto em lei federal. Mas o paradigma vigente da gestão de fauna no país e a burocracia parecem agir no sentido de proteger o javali. Por exemplo, o sistema informatizado preparado pela EMBRAPA e cedido ao MMA – o SIMAF – não foi implantado até hoje, pois, lá no IBAMA, o gabinete responsável seria contra a caça e por isso não quer ver funcionando algo que beneficiaria a gestão do problema. É inconcebível ainda dependermos de um sistema de gestão ultrapassado.

Há muito diletantismo nas discussões sobre como controlar javalis. Os termos ‘erradicação’ e ‘esterilização’, por exemplo, revelam o raso conhecimento do problema por parte de quem os recomenda. As experiências de sucesso de erradicação de javalis pelo mundo são raras, e ocorreram na sua maioria em ilhas onde a recolonização natural é quase impossível devido ao isolamento. Não existe até hoje solução prática e viável do problema em escala continental que envolva esterilização. Por isso, no geral, se fala em controle populacional e mitigação de impactos.

Quando falamos de programas de controle de javalis em escala continental como a brasileira, devemos olhar para experiências similares ao redor do mundo. A caça de controle é recomendada em todos os países afetados pelo problema e não capricho de pesquisadores, caçadores e gestores ambientais tupiniquins. O conflito de interesses dessa estratégia é evidente: caçadores não estão interessados no extermínio da população, o que poderia significar o fim de sua atividade. Porém, assim como a caça predatória – e não regulamentada – leva espécies nativas à extinção, a caça do javali pode ter efeito similar na redução da densidade e crescimento populacional.

“A caça de controle é recomendada em todos os países afetados pelo problema e não capricho de pesquisadores, caçadores e gestores ambientais tupiniquins.”

Técnicas aditivas são necessárias. Armadilhas currais, por exemplo, podem aprisionar bandos inteiros e ter um efeito ainda maior na redução das populações. No entanto, não se pode subestimar os javalis: se não operada corretamente, os animais tem grandes chances de aprender que as armadilhas são um risco e jamais cairão na arapuca.

Acredita-se que as populações de javalis na Europa – continente de sua distribuição nativa – crescem a uma taxa de 5% a 15% anual, o que significaria uma população 2 vezes maior do que é hoje em apenas 5 a 15 anos. E por lá existem pelo menos 7,5 milhões de caçadores ativos. Por aqui contamos com um efetivo de cerca de 30 mil caçadores regulamentados, uma fração de 0.5% da Europeia, apesar da pouca diferença em extensão territorial. Não obstante, a EFSA (a autoridade europeia em saúde animal) recomenda o recrutamento de novos caçadores como estratégia para diminuir as densidades populacionais dos javalis por lá.

Diferentemente da Europa, os javalis no Brasil são em sua maioria híbridos do cruzamento com o porco doméstico, podendo apresentar crescimento populacional ainda maior, pois podem ter herdado do porco a capacidade de gerar proles mais numerosas. Aliado à isso, o ambiente, as lavouras e os rebanhos brasileiros proporcionam alimento em abundância o ano todo, o que acelera ainda mais o crescimento e expansão do javali no país. Qualquer controle que queira frear o crescimento populacional desses animais deve objetivar a remoção anual de 65% da população. Se com caçadores já é difícil, que dirá sem eles.

O Brasil precisa parar de perseguir os poucos caçadores legalizados e treinados a controlar javalis que existem e que nos prestam esse serviço gratuitamente. Enquanto discutimos se é certo ou não caçar, e quais os inúmeros documentos que os controladores devem ter para fazer o abate, os javalis prosperam. O risco de uma crise econômico-ambiental de larga proporção é iminente.

Este é um problema que vai de ambientalistas à pecuaristas. Se o cenário de gestão do problema dos últimos anos prevalecer no futuro, seremos testemunhas do agravamento dos danos econômico-ambientais e dos riscos para a saúde humana. Esperamos que recomendações técnicas e científicas norteiem a tomada de decisões e que possamos tratar deste assunto com a seriedade que merece.

 

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  • Felipe Pedrosa

    Felipe Pedrosa é Ecólogo, doutorando em Ecologia e Biodiversidade pela UNESP de Rio Claro-SP.

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Comentários 18

  1. Eduardo Julián diz:

    A caça de javalis é ridicula vou denunciar esse site


  2. Manoel Filho diz:

    Vocês tem é que falir. Não respeitam o animal na hora do abate e ainda ficam sorrindo enquanto o animal sofre de dor;


  3. Manoe Filho diz:

    Eu ate concordo com a caça para controle populacional, mas tem uns caçadores que são uns tremendos de uns filhos da puta que adoram ver o bicho sofrer antes do abate. Isso sim tem que ser denunciado. Queria colocar aquele monte de chachorro em cima desses viadinhos e ver eles sofrerem, so pra eles sentirem na pele a dor que o bicho sente pra saciar o prazer sadico deles.


  4. Javali diz:

    Deixa os Javalis viverem…


  5. Waldeir diz:

    O certo é o Ibama, facilitar a documentação, para a caça ao javali. E estender o prazo da licença aos caçadores. E a polícia florestal ter mais respeito com os caçadores, que estão fazendo o controle de graça. De algo que o Ibama perdeu o controle.
    Quem é contra a caça ao javali, têm que reclamar com quem perdeu o controle da situação. Ou seja o Ibama.


  6. Luiz diz:

    O certo é todos que são contra o abate do javali pagar a conta dos estragos gerados por essa praga que só faz estrago no Brasil é oq eu acho


    1. Manoel Filho diz:

      tu tem é que falir e passar fome, seu assassino!


  7. Silva diz:

    Caçadores são sádicos, só prejudicam o meio ambiente porque caçam animais silvestres. Colocar arapucas ou armadilhas para os javalis é crueldade animal! Aprovar a caça é um retrocesso. A esterilização é a melhor maneira de evitar a superpopulação de javalis.


    1. Manoel Filho diz:

      Sao sádicos mesmo, amigo. Se eles abatessem o animal de forma honesta, mas fazem o bicho sofrer até a morte. Eu quero que eles percam tudo, bando de filha da puta.


    2. Arthur diz:

      Tinha que matar era a porca que deu luz em voce


  8. sentienttranslations diz:

    Para quem acredita em contos de fada de que caçador é um animal com ética… a caça ao javali vai afetar animais silvestres. Caçadores o fazem por esporte e gosto pelo sangue, não pelo desejo de equilibrar o meio ambiente. Aliás, quem introduziu o javali – essas pessoas não vão ser punidas? E por falar em praga, existe uma chamada Homo Sapiens que ninguém fala em controlar e que causa o grande dano ao planeta.


    1. Manoel Filho diz:

      Exatamente! Perfeito comentário


  9. O Poder Público deve agir de todas as formas para controlar a população de javalis, ou famosos "javaporcos". Em algumas regiões do Sul do Brasil, a espécie dizima plantações, e os prejuízos aos agricultores são enormes.


  10. usuario diz:

    Hummm, se nem nos EUA e Europa eles conseguiram dar conta, vai ser interessante ver isso acontecer aqui. Mas, independente do que diz a razão, torço para que esses animais sejam controlados dentro de nosso território.


  11. Paulo diz:

    Precisamos urgente ação, para combater os "transportadores de javaporco, javali e demais similares" que estão introduzindo e translocando estes animais para outras regiões, que ficam kilômetros de distância. Precisa de investigação da polícia federal.


    1. Arthur diz:

      Você é um retardado! Otario e sem noção!


  12. Edmur Braga diz:

    No Estado de São Paulo está proibido o controle como explicar isso o prejuízo incalculável na lavoura e no meio ambiente ontem eu presenciei um estrago em uma roça de milho que deu vontade de chamar Ibama pra ver o tamanho do estrago


    1. Leandro diz:

      não adianta tentar acabar com a praga imitando os países que não tiveram sucesso na empreitada.
      Eu sou apenas um curioso mas tenho ideias para acabar com essa praga ou desacelerar o crescimento.
      existe formas de monitorar certos grupos implantando chips em alguns, e assim ter noção exata de seu deslocamento. outra estratégia é implantar no DNA de alguns deles algumas falhas que propiciam doenças degenerativas dos ossos, por exemplo,impossibilitando que se desloquem rápido por longas distâncias, a chicungunha por exemplo pode ser potencializada e assim debilitar seu deslocamento. É muito mais fácil caça los antes de nascer do que lutar contra seu crescimento natural.