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O que venta lá, também venta por aqui

Novas tecnologias surgem a todo momento para mudar paradigmas e impor novos desafios à sociedade moderna. População pode buscar só a informação que lhe interessa.

28 de outubro de 2008 · 15 anos atrás

Outro dia tive o privilégio de assistir uma palestra do fotógrafo Bruno Veiga. Ele já trabalhou nos melhores jornais do Brasil e na revista Veja; tirou fotos para publicidade, publicou imagens de natureza, fez ensaios para o Teatro Municipal do Rio de Janeiro e expôs belas coletâneas de fotos artísticas. Bruno é aquilo que podemos chamar de fotógrafo profissional. Sabe o que está fazendo e faz tão bem que as pessoas pagam para ver o resultado de suas clicadas, seja em forma da mídia que precisa ilustrar suas notícias, do grande comércio que quer vender seus produtos ou do grande público que gosta de pendurar uma bela fotografia na parede da sala.

Como se vê, não faltava a Bruno material para falar de seu próprio trabalho. Mas não. Ele preferiu fazer uma digressão pelo momento atual da fotografia. Segundo explicou, acabou-se a era dos fotógrafos todos-poderosos, que dominavam a técnica de complicadas e caríssimas câmeras e que sabiam como revelar seus filmes. Hoje é possível ver como uma fotografia ficou sem precisar revelar um filme (e pagar por isso). Qualquer amador pode verificar no visor de sua máquina digital como sua foto ficou. Não gostou? É só apagar e tirar outra. Custo zero.

Por outro lado, o photoshop pode corrigir eventuais errinhos e “maquiar” qualquer retrato. Acabou-se a era do fotógrafo que se impunha por que dominava a técnica de registrar imagens. Hoje a técnica perdeu relevância. A foto tem que ser boa na hora em que foi tirada e para isso vale menos a certeza de que quem está por trás da câmera sabe o que está fazendo do que o resultado que obtém.

Com efeito, os fotógrafos perderam o canal que lhes assegurava exclusividade. Não é mais necessário ser um excelente técnico em manuseio de câmeras fotográficas para se tirar boas fotos. Mas esse fenômeno está só começando e, ao contrário do que pensa Bruno, não está afetando apenas os fotógrafos. Como já tratei aqui em O Eco, o GPS está tirando dos versados na arte da leitura cartográfica a exclusividade da navegação no mato.

Quer ler sobre caminhadas? Revistas tradicionais não são mais o único canal. Não é necessário mais esperar um mês para comprá-la e, ainda assim, ser obrigado a ler exclusivamente sobre os destinos escolhidos pelo editor-chefe. Você não quer ir para nenhum daqueles lugares que a revista publicou. Basta entrar no google e fazer uma busca. Vai encontrar até o mais exótico dos lugares, como por exemplo Brunei Darussalam.

Com certeza, estamos vivenciando uma segunda revolução da informação. A primeira ocorreu quando descobriu-se a técnica que permitiu a reprodutibilidade da informação, seja pela Imprensa, seja pela litografia e, posteriormente, fotografia. Esse processo tornou copiáveis livros e retratos e democratizou a informação, dando acesso ao saber a milhares de pessoas. O atual momento, entretanto, vai muito mais longe, pois permite ao cidadão ir além de chegar à informação através de um canal (livro, revista, estação de rádio etc). Faculta a ele alcançar a informação exata que procura, seja ela musical, escrita, ou visual, sem precisar submeter-se à ditadura do que lhes é restringido pelos proprietários de rádios, gravadoras, jornais, editoras, televisões e quetais.

O fim dos “canais” todos poderosos tem seu ônus. Como remunerar os compositores e músicos se seu produto pode ser baixado gratuitamente da Internet? Como financiar grandes produções cinematográficas, ou televisivas, se o filme pode ser visto sem custos diretamente nas telas dos computadores? Como sustentar uma editora se um livro, semanas depois de publicado, já pode ser encontrado em PDF em meia dúzia de sites de literatura?

No momento, são todas perguntas de difícil resposta. No que toca a mim, sei que a rede tem possibilitado uma série de desdobramentos ruins. Outro dia, ao corrigir o trabalho de uma turma de MBA em ecoturismo, deparei com um texto tão bom, mas tão bom, que não acreditei em sua originalidade. Fui pesquisar na internet e bingo! Lá estava, tal e qual. Copiado e colado. Em conversa recente com Kiko Nascimento Brito, um dos fundadores do site O Eco, descobri que o veículo é plagiado diuturnamente por quase uma centena de veículos midiáticos, quase sempre sem citar a fonte. Uma dessas piratarias chegou a render ao corsário um prêmio de Melhor Reportagem sobre a Amazônia do Ano de 2006.

Por outro lado, sem essa nova realidade não estaria eu sentado aqui nesse momento escrevendo este texto, pois o mesmo O Eco vítima de tantos plágios não existiria. Tampouco existiria o Terra Limpa TV, uma iniciativa artesanal muito bem produzida que trás ao visor de meu “PC” pequenos filmes sobre belas trilhas feitas por quem sabe o que é caminhar, com dicas de como chegar e toques de educação ambiental.

Ao assistir o programa, só posso concluir que o progresso em si nunca é ruim. Ruim é o uso que o Homem pode fazer dos novos inventos. Só depende de nós usá-los de forma a melhorar a vida de todos.

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