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Sua aposentadoria pode ser esturricada ou ir por água abaixo, literalmente

As mudanças climáticas criam um risco ambiental escondido nas empresas, às vezes com ajuda do governo, que pode arruinar seus investimentos.

11 de novembro de 2015 · 8 anos atrás
  • Paulo Barreto

    Sonha com um mundo sustentável e trabalha para que este desejo se torne realidade na Amazônia. É pesquisador Sênior do Imazon.

Foto: Keith Laverack

Imagine a frustração e desespero. Você investiu em ações da Petrobras e na Volkswagen confiando que elas seriam empresas sólidas e produziriam dividendos para sua aposentadoria. Agora que você está pronto para se aposentar, o valor destas empresas caiu 65% (em comparação a setembro de 2014) e 37%, respectivamente. A Petrobras caiu, entre outros, porque o seu principal acionista usou a empresa para controlar a inflação (impedindo o aumento do preço dos combustíveis) e porque parte da sua direção indicada por políticos está envolvida em corrupção. O valor da Volkswagen caiu, pois se descobriu que a empresa criou um sistema para enganar os testes de emissões de poluição dos carros a diesel. Depois da queda, ninguém sabe direito o futuro da Petrobras e da Volkswagen o que aumenta ainda mais o desespero do investidor.

Agora, você que quer poupar para a sua aposentadoria está ainda mais preocupado em saber o risco das opções de investimento. Adicione mais uma preocupação: qual o risco das mudanças climáticas afetarem o negócio?

Embora alguns poucos continuem negando, as mudanças do clima estão ocorrendo e afetando os negócios. As seguradoras já estão pagando o preço por causa do aquecimento global. O pagamento no mundo de seguros por desastres climáticos quintuplicaram em termos reais (descontando a inflação) de cerca de R$ 10 bilhões para R$ 50 bilhões desde a década de 1980, segundo o presidente do Banco Central da Inglaterra. Além dos seguros, outras empresas tendem a sofrer. Por exemplo, secas constantes podem reduzir a produção agropecuária e desvalorizar o valor de determinadas terras. Novas regras para reduzir as emissões dos gases que causam o aquecimento global podem impor custos adicionais para as empresas.

O risco é tão grave que a Universidade de Oxford na Inglaterra criou em 2012 um programa chamado Ativos Encalhados (Stranded Assets) para avaliar os riscos de ativos perderem seu valor. Além disso, o presidente do Banco Central da Inglaterra alertou que o aquecimento global pode desencadear o colapso no setor de seguros e afetar o resto da economia. Ele lidera um grupo que sugerirá aos líderes do G20 (os países com as 20 maiores economias) que as empresas divulguem o quanto estão envolvidos com as emissões de gases que causam as mudanças do clima.

Enquanto isso não acontece, cada um deve ser cauteloso nos investimentos.

Este ano, a falta de transparência sobre o risco ambiental me fez desistir de investir em Letras de Crédito do Agronegócio. Os bancos emitem estes papeis para buscar recursos para financiar a produção agropecuária. A funcionária do banco me estimulou a investir na LCA dizendo que geraria bom rendimento, pois é isenta do imposto de renda e ainda seria de baixo risco. O risco seria supostamente baixo porque a LCA é lastreada em produtos físicos como a soja e milho, máquinas e equipamentos. Como sei dos riscos ambientais no setor rural, pedi os prospectos da LCA para estudar em casa. As páginas finais do prospecto diziam que o desempenho pode ser influenciado por riscos ambientais. Mais quais os riscos ambientais? Nenhuma informação estava disponível. O ideal é que as empresas que captam estes recursos tivessem certificados de boas práticas ambientais para reduzir seus riscos. Se uma fazenda desmatou ilegalmente, o órgão ambiental pode confiscar bens e produtos. Por isso, eu gostaria de um atestado que as fazendas financiadas respeitam o código florestal.

Falta Transparência

“Ministério do Meio Ambiente editou regulamentação que proíbe o acesso às informações sobre os proprietários rurais registrados no CAR.”

Infelizmente, representantes do agronegócio brasileiro tem trabalhado para reduzir a transparência ambiental do setor em vez de promovê-la. Por exemplo, o novo código florestal exige que os imóveis rurais sejam registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR). O CAR contém o mapa do imóvel e identifica o seu detentor ou proprietário. Estas informações permitiriam várias análises sobre riscos ambientais. Por exemplo, ao cruzar o mapa do CAR com imagens de satélite, seria possível identificar desmatamentos ilegais. Segundo o código Florestal, a partir de 2017 os bancos só poderão emprestar dinheiro para imóveis registrados no CAR. Entretanto, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado aprovou em setembro de 2015 que o prazo para cadastramento no CAR seja adiado  até maio de 2018. Embora o projeto de lei ainda precise ser aprovado por outras comissões e pelo plenário da Câmara para entrar em vigor, o episódio mostra que representantes do setor rural preferem adiar a transparência ao invés de acelerá-la para dar segurança aos investimentos no setor. Além disso, o Ministério do Meio Ambiente editou regulamentação que proíbe o acesso às informações sobre os proprietários rurais registrados no CAR.

Ao mesmo tempo, o governo brasileiro tem sido contraditório sobre a produção e uso de informação sobre os riscos climáticos. A Secretaria de Estudos Estratégicos da Presidência da República encomendou vários estudos para prever os riscos e as medidas de adaptação às mudanças climáticas. Entretanto, a troca de secretário em marco de 2015, levou à demissão da equipe que coordenava os estudos. Somente em outubro de 2015, foi divulgada parte do estudo “Brasil 2040 – Alternativas de Adaptação às Mudanças Climáticas”. Os estudos trazem várias previsões preocupantes sobre energia, saúde, agricultura e infraestrutura. Se as medidas de prevenção não forem tomadas, o Brasil tende a ficar mais quente e seco nos próximos 15 anos. Em consequência disso, a geração de energia hidrelétrica pode ser reduzida entre 8% e 20%. A redução de área potencial para lavouras pode ser de até 39,3%, no pior cenário. Por isso, o valor da terra pode cair em várias regiões: até 36% no Pará; 2% a 16% no Maranhão, 14% a 26% no Tocantins e 3% a 14% no Piauí.

As empresas e governo deveriam considerar estas análises para projetar investimentos que não fiquem encalhados. Entretanto, o próprio governo está agindo na direção contrária em alguns casos. Por exemplo, o Ministério da Agricultura está promovendo a expansão da agricultura na região chamada de Mapitoba (o cerrado do Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia). O desmatamento nesta região está aumentando, o que pode aumentar a seca e reduzir o valor das terras. Isso significa que, além de demandar transparência sobre os riscos dos investimentos privados, é necessário demandar que o poder público, que investe nossos impostos, seja também transparente e não invista em projetos que vão ficar encalhados.

 

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Comentários 4

  1. paulo diz:

    Novamente os Governos omitindo informações de direito da populaçao Brasileira. O raça do demo estes políticos.


  2. paulo diz:

    Calma Manoel, não generaliza. Existe aos montes ações e maneiras diferentes nestas questões. Calma Manoel.


  3. Edvard Pereira diz:

    Diante de tantas burrices e imbecilidades só nos resta admitir: o fim da raça humana está próximo, muito próximo, mais próximo do que imaginávamos. Mas que vivam os animais. Estes sim, merecem viver,pois este mundo foi criado para eles!


  4. Luiz Eduardo diz:

    A imcompetência da governabilidade brasileira é responsável por desencadear um episódio de crises nos diversos setores. Essa crise generalizada fragiliza o governo e aí é um momento oportuno para toda bancada ruralista articular seus planos egoístas a seu favor. Onde se viu em pleno 2015 onde o planeta precisa de mudanças urgentes na forma de produzir, pessoas que se dizem políticos terem o pensamento tão retrógrado e vazio…naõ custa muito entender que quem investir em modelos sustentáveis de produção estará dando uma largada importante para o novo cenário de desenvolvimento econômico e sustentável que começa a surgir na esfera econômica mundial. É difícil porque até o principal personagem que é a presidenta consegue falar em discurso na Assembléia Geral da ONU sobre "estocagem de vento". É lamentável.