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Corte e castigo

A atual legislação costuma punir com firmeza o corte de árvores, urbanos ou rurais. Mas será que tamanha rigidez protege a natureza, ou apenas cria mais repulsa a ela?

13 de março de 2007 · 17 anos atrás
  • Eduardo Pegurier

    Mestre em Economia, é professor da PUC-Rio e conselheiro de ((o))eco. Faz fé que podemos ser prósperos, justos e proteger a biodiversidade.

Esse artigo começa com uma indagação e termina com um desafio.

Será que teríamos mais árvores se as leis não tornassem tão difícil derrubá-las? Um amigo que mora em uma casa no bairro de Laranjeiras, no Rio de Janeiro, me contou seu caso. “Se você precisar fazer uma poda ou uma retirada de árvore, está perdido”, contou. “Leva dois meses de burocracia e custa uma grana forte. Gastamos mais de mil reais e dois meses de espera para remover uma árvore comum e, assim, poder realizar uma mudança paisagística no terreno”.

Segundo o relato, o processo, no município do Rio de Janeiro, começa com o preenchimento de um formulário da Fundação Parques e Jardins. A licença para o corte custa cerca de R$400,00. Além disso, é preciso fazer uma compensação ambiental, plantando outras árvores. O meu amigo pagou outros R$400,00 à Prefeitura, em princípio, usados na compra de vinte mudas de pau-brasil. Para a remoção, foi necessário contratar uma empresa de corte credenciada pela Parques e Jardins e outra para remover o “cadáver”. No final, conta ele, “A última coisa que você quer ter é uma árvore”.

Imagino que ao ler essa história, muitos ambientalistas aprovem a dureza do procedimento. Talvez achem até que as exigências sejam brandas demais. Queremos preservar as árvores, não queremos? O primeiro impulso nesse sentido é tornar difícil e caro cortá-las. Ocorre que as coisas podem não ser tão simples. Quando se sabe de antemão, que o custo de sair de uma situação é alto, o melhor é evitá-la.

Isso lembra uma frase que me marcou durante a leitura do livro sobre caça submarina Super Sub, de Américo Santarelli, pioneiro do esporte e campeão mundial de mergulho em 1960. “A melhor maneira de sair de uma encrenca é não entrar nela”, escreveu ele. A caça submarina é um esporte que produz um número surpreendente de fatalidades, talvez porque a prática da apnéia, traiçoeiramente, pareça fácil e segura.

As árvores de hoje um dia ficarão velhas e morrerão. Será que as pessoas irão plantar as suas substitutas? Será que uma legislação que só pune e não incentiva obterá o melhor resultado?

De acordo com a teoria, quem planta uma árvore dentro da sua propriedade está produzindo um bem para a sociedade. Em economês, uma externalidade positiva. O livro-texto diz que ações desse tipo não deveriam ser punidas, mas premiadas. Quem merece castigo são aqueles que produzem poluição, isto é, externalidades negativas.

A atual abordagem ajuda a preservar as árvores que existem, mas talvez diminua as que estão porvir. É difícil apresentar provas nesse sentido, pois árvores que não foram plantadas são invisíveis. Mas é possível que, a longo prazo, o resultado dessa abordagem seja bastante negativo.

Ao debater essas idéias, ouvi outra história que corrobora minhas especulações. Uma amiga tem um sítio de 50 hectares na região do Parque Estadual de Três Picos, em Nova Friburgo. Trata-se do maior parque do estado do Rio, com 46 mil hectares, ou uma vez e meia o tamanho do Parque Nacional de Itatiaia. A propriedade é usada para lazer e os donos mantêm um percentual de cobertura florestal de 40%, o dobro da Reserva Legal exigida.

Um dia, o caseiro foi encarregado de limpar o mato de um canto de terreno. Ao vistoriar o serviço, descobriu-se que ele havia também derrubado três pequenos pés de embaúba, árvore nativa da Mata Atlântica, também conhecida por árvore do bicho-preguiça, que adora os seus frutos. Desconcertada, a dona do sítio pediu explicações ao caseiro. Ninguém havia pedido a derrubada de árvore nenhuma. A resposta dele foi direta. Embaúba tem que ser cortada logo que nasce, porque depois não pode mais. Se o IEF (Instituto Estadual de Florestas) descobrir, aplica uma multa de três mil reais.

A mesma pessoa viveu uma situação parecida ao retirar de sua propriedade uma plantação invasora, que partia de um vizinho. Depois de recuperar o terreno, recebeu três ofertas de moradores da região. Elas consistiam em manter a área livre de mata nativa, pois permitir a volta da floresta significaria perder o controle do uso da terra.

Tudo isso me levar a pensar que deveríamos punir menos a remoção de árvores e incentivar mais o seu plantio. Estou certo? Qual seria a melhor combinação de incentivos para aumentar a cobertura, por exemplo, de áreas urbanas? Seria uma isenção fiscal ou algo do gênero?

Peço ajuda ao leitor. Qual seria a sua solução?

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Comentários 2

  1. Emely Viegas diz:

    Oi,,muito visinho está querendo cortar um pé de embaúba, q já está grande e abriga alguns tucanos,,como faço para ele n cortar ? Por favor tem algum número q eu possa tá ligando pra impedir?


  2. Curiosidade zero diz:

    Embaúba, me desculpa querida. Que pena!
    Estava procurando sementes de Embaúba para comprar e enfeitar minha chacrinha com essas arvores tão lindas, porem por sorte, vim parar no seu artigo.
    Que me alertou para quando tiver intenção de plantar uma arvore. Tomar cuidado.
    Daqui para frente, vou estudar o regulamento de corte da arvore escolhida, para depois resolver se planto ou não planto.
    *” Nós brasileiros somos dos extremos, permitiremos que cortem tudo ou então que não cortaram nada” *
    (É tudo ou nada. kkk)